domingo, fevereiro 03, 2008

Reeducação Postural: percursos de um paradigma de intervenção


Não há, com muita pena minha, um costume bem fundado de se discutirem comparativamente os diferentes métodos de fisioterapia, com base numa pura reflexão do tipo metodológico. Os métodos de intervenção fisioterapêutica são tantos e são tão poucos aqueles que (ainda) os discutem, comparam, estudam e professam...
Nos últimos anos, tem sido meu apanágio de estudo a investigação acerca dos métodos de reeducação postural. Não esquecendo que o termo “postura” possui inúmeros sentidos (Tribastone), e que o conceito de “reeducação postural” pode adquirir diferentes entoações por parte de diferentes autores, não posso deixar de vociferar a favor daquele que considero ser o método mais global da ciência e arte fisioterapêutica: a “reeducação postural”.
Não entendo por “reeducação postural” o tipo de ginástica sueca que Per Henrik Ling (1766-1839) fundou e que viria a toldar os espíritos gímnicos durante séculos. Também não entendo por “reeducação postural” certos métodos de tratamento da escoliose como o método Schroth, o método de Rudolf Klapp, o método do Instituto Ortopédico Pini, o método em cifose, o método do psoas, o método Gimnasium, o estruturalismo psicomotor, a reeducação proprioceptiva neuromuscular, a ginástica proprioceptiva e as técnicas de desequilíbrio, apesar de muitos destes modelos de intervenção se aproximarem bastante do modelo que preconizo. Também não entendo por “reeducação postural” esse tão badalado método Pilates, que, admitindo a sua excelência, não mexe com a capacidade de flexibilidade global cara à “modificação estrutural” que só os métodos que defendo conseguem.
Para mim, os verdadeiros métodos de “reeducação postural” são aqueles que defendem o que defende Souchard com a sua Reeducação Postural Global (RPG), toda uma nova fisiologia do “sentir” e do “tratar”, baseada nos princípios das “cadeias musculares” e fundamentada pelos modelos mais sincréticos de “intervenção postural”.
Nos últimos anos, os cursos de fisioterapia andam a sofrer cortes conteudísticos irracionais, sendo que muitos tendem a “cortar” precisamente na parte dos cursos dedicada aos princípios e práticas da “reeducação postural”. Mas ainda assim nada justifica a plena nesciência arrolada à volta deste conjunto de métodos. Pois, para quem não sabe, o RPG não é um método puro, é antes uma elucubração relativamente ao grande método original (francófono) de “reeducação postural”: o método Mézières.
A Madame Mézières e o seu método constituem uma verdadeira “revolução na ginástica ortopédica”. Esse ano de 1947, ano das observações iniciáticas de Mézières da lógica das compensações musculares, viria a ser conhecido como o ano de criação de conceitos como os de “excessos musculares”, “cadeia muscular posterior”, “cadeia diafragmática” e do princípio “Il n’est que des lordoses”. Saiba-se que a grande maioria dos princípios defendidos por Souchard já eram princípios de Mézières (ainda assim, não deixa de ser meritório todo o trabalho feito por Souchard, tanto no respeitante à divulgação de conceitos como no respeitante à criação de uma nova linha de posturas). E saiba-se também que o método Mézières deu origem a todo um outro conjunto de métodos, alguns completamente desconhecidos dos fisioterapeutas: a grupal “antiginástica” de Bertherat, as globais “morfoanálise” de Peyrot e “Cadeias musculares e articulares” de Godelieve Denys-Struyf, os pragmáticos “Reeducação Postural Global” e “Stretching Global Activo” de Souchard, o dinâmico método das “Cadeias musculares” de Busquet e o fantástico e integral método da “Reconstrução Postural” de Nisand. É toda uma miríade de métodos, todos eles discípulos de Mézières.
Entre as exigências de uma intervenção fisioterapêutica cada vez mais rendida ao “sistema” e a sapiência de uma fisioterapia “global” ideal, convido qualquer um a descobrir os caminhos que medeiam estes métodos e a “filosofia” de intervenção global, (favorável ao alongamento e relaxamento, e desfavorável ao fortalecimento e excessos do fitness), que deles nascem de forma inalienável.
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Publicado no boletim/revista da APF de Janeiro 2008