sexta-feira, agosto 14, 2015

«O homem-Deus»

Já disponível na editora (edicoesmahatma@mail.com para encomenda) e nas livrarias Bertrand:

http://www.bertrand.pt/ficha/o-homem-deus-?id=16874664


quarta-feira, abril 22, 2015

Anti-vacinação e homeopatia: o que falta referir

Vive-se, neste momento, uma intensa polémica à volta das (apelidadas) "terapias não convencionais", sobretudo a homeopatia, e da temática da "anti-vacinação", todas estas o produto de uma intensa querela que tem contraposto o modelo clínico/materialista ao novo - e tão propugnado - modelo da "Nova Era", cambiante de uma "nova ordem" na forma de ver e interpretar as questões da Saúde. Na verdade, há várias questões complexas a ter em conta no domínio da polémica citada, muitas delas insuficientemente explanadas, injustamente elididas.
Em grande medida, é impossível discutir o tema em causa sem recrutar toda uma dimensão epistemológica, complexa e multivariada, que parece muitas vezes ver-se omitida. Vive-se, fortemente, uma dualidade, que é, na realidade, o binómio dominante do tempo Humano. Essa dualidade contrapõe o materialismo ao espiritualismo, o cientificismo ao dogmatismo (no "bom" sentido do termo), o modernismo ao pós-modernismo, o realismo ao idealismo e o positivismo à dialéctica. Em tempos o dogmatismo prosperou, mas o Renascimento e o Iluminismo vieram cientificar, categorizar, organizar cognitivamente, o terreno do corpo-mente, gerando a visão de uma "Clínica" (Foucault), de mote analítico, mais tarde alvo de crítica pelos que se dizem "holísticos". Num tempo em que o materialismo ainda é preponderante, uma nova forma de Renascimento - o Renascimento pós-moderno, a "Nova Era" espiritualista - parece vir responder a prementes necessidades humanas e afectivas, necessidades muitas vezes insuficientemente atendidas pelo profissional de saúde "científico". E, assim, mesmo dentro dos campos da medicina, enfermagem e fisioterapia, duas tendências dominantes parecem contrapor-se com vigor (apesar de, a meu ver, não serem mutuamente exclusivas): a "medicina baseada na evidência", centrada fortemente em estudos do tipo "estatístico-probabilístico", e a Saúde Holística, baseada num modelo essencialmente casuístico e, quiçá, pós-moderno (fenomenológico e interpretativo).
Acontece que, nos domínios da Espiritualidade mais antiga, e fazendo uso de Platão, é possível ater a possibilidade de existir um nível de "Razão" que transpõe o domínio do que actualmente se entende por "ciência". Na verdade, o termo Scientia advém da "Epistémi" platónica, que, segundo «A República», inclui um nível de "Dianóia" (semelhável ao que a ciência moderna entende enquanto "ciência", filha dilecta do liberalismo) e um nível (superior) de "Noésis", meta-racional, dificilmente redutível ao "analítico" e ao modernamente científico, e só concebível no formato de uma hermenêutica vívida, gnóstica e dialéctica. Assim, nos termos da filosofia Idealista/Espiritualista, é possível conceber a existência de um nível de Razão só atingível pelo instrumento dialéctico e argumentativo. Ora, acontece que, supostamente, muitas das terapias "não convencionais" lidam com forças que transcendem o "material" e o "comensurável"/"analítico". Para esses terapeutas, tratam-se de forças meta-racionais, energias de um nível psíquico e, mais, espiritual, só concebíveis em termos de um entendimento profundo, singular, muitas vezes irredutível à linguagem da ciência moderna e aos estudos já citados. No entanto, visto não haver forma de "falsificar" (para utilizar o termo de Popper) ou "reduzir" muitos dos (supostos) efeitos destas terapias, na perspectiva da ciência moderna esta suposta Razão é tão-só uma forma disfarçada de crença, se não uma maneira subtil de enganar, de intrujar. Os proponentes da ciência moderna têm a sua razão, porque a retórica permite muito e pode levar a tomar por racional e verdadeiro o que não o é verdadeiramente (o que significa que a suposta "Noésis" obtida não o chegou nunca a ser). Os perigos do que Popper apelidava de "relativismo dogmático" (e o filósofo "tomou de ponta" a própria psicanálise) são inúmeros, porque a retórica em questão permite justificar tudo, o facto de algo resultar, o facto de algo não resultar e o "assim-assim".
Não obstante, aquele nível de Razão é (pré)aceitável no ponto de vista de alguma Filosofia, menos aceitável são os quase inexistentes critérios que permitam discriminar o "verdadeiramente racional" do "falso racional".
Muitas das terapias "não convencionais" são baseadas em princípios "idealistas", supostamente racionais, que muitas pessoas aceitam aprioristicamente, no que os materialistas associariam a um processo de "aceitação acrítica", movida pelo sentimento e pela crença. E a irredutibilidade destas terapias contribui para criar um fosso entre os dois paradigmas difícil de resolver, porque o que respeita aos Princípios de muitas destas terapias não é aparentemente do foro instrumental e analítico dos críticos materialistas. E a verdade é que, supostamente, estas terapias operam a um nível espiritual e "trans-corpóreo" (metafísico) que, para os materialistas, é tão-só corpo e nada mais. O que também nos poderia levar a pensar que estas terapias não actuam a um nível e num prazo consistente com o que as pessoas efectivamente desejam. O que querem mesmo as pessoas? A saúde do corpo, o bem-estar, ou a libertação e a transcendência?... Porque a transcendência, no seu verdadeiro sentido, já está para além da "pessoa" em si mesma, tal como o Espírito, que já não respeita tanto à pessoa no sentido individual, emocional e afectivo. E, no entanto, as pessoas procuram as terapias, movidas pela urgência do "bem-estar", que, ainda assim, é epifenómeno da modernidade, a mesma a que aquelas terapias pretendem contrapor.
E, dentro do mesmo espírito de crítica à ciência moderna, de transposição do modelo dominante, surgem, quase sempre dentro dos contextos "naturalistas" e "espiritualistas", as contraposições aos fármacos, às vacinas, a tudo o que o mesmo Espiritualismo propõe ser uma grande máquina de destruição do corpo (ou será da alma?). Acrescem-lhe as críticas ao modo de efectuação de estudos, incluindo a fraude científica, a limitação dos estudos com base em médias, os interesses dos próprios cientistas e das indústrias (e a forma como os interesses, as profecias auto-confirmatórias, mexem com os resultados obtidos, fantasma do pós-modernismo crítico). E o mais irónico é que as terapias "não convencionais" começam também já a ter os seus estudos publicados, no mesmo modelo que o Espiritualismo critica. Mas os materialistas preferem muitas vezes ignorar esses estudos, ou, no mínimo, apontar-lhes as limitações. São movidos pelo preconceito, pelas suas próprias crenças? Eles advogam que não, que a ciência é feita de "provas" e não de preconceitos. E, assim, o que os "terapeutas" acusam nos cientistas é precisamente o mesmo que os cientistas acusam nos "terapeutas". E o esforço de conciliação, de síntese honesta, acaba por ser reduzido ao pré-juízo, à incomensurabilidade de paradigmas (nos termos de Kuhn).
No fim, restam os restolhos de uma limitada síntese de saberes, pois que as pessoas preferem adoptar posições extremas, quando a verdade é que nem o paradigma "espiritualista" é, de facto, o que muitos entendem enquanto tal, nem o modelo materialista é assim tão infalível; e do mesmo modo fica a faltar a aclaração de conteúdos epistemológicos. Enquanto fisioterapeuta que sou, posso dizer que, mesmo dentro da Fisioterapia, se criam condições para grandes querelas epistemológicas, infelizmente sem que os terapeutas possuam preparação teorética para tal (o que leva a que os mesmos se agarrem também de forma radical a um daqueles modelos). O fundamentalismo, seja espiritualista, seja materialista, tem os resultados visíveis. Grandes "guerras" se prevêem, e o paciente sentir-se-á muitas vezes divido pelos modelos preferenciais dos próprios terapeutas. Eu mesmo me divido entre os dois modelos, e nem sei se falo enquanto fisioterapeuta ou enquanto ensaísta.

quinta-feira, março 26, 2015

«Crítica da Razão Espiritual»

É o título da mais recente das minhas produções. Ela implica o maior trabalho estético que alguma vez coloquei num livro. É um dos livros que considero mais conseguidos. E talvez por ser tão "rigoroso" e trabalhado, este meu livro tem saída limitada, sendo difícil de ser encontrado nas livrarias. No caso de quererem tê-lo de modo mais célere aconselho-vos enviarem-me um email para coelholewis@hotmail.com ou para a Editora Mahatma (edicoesmahatma@mail.com).


Podem também consultar este link: 

http://www.bertrand.pt/ficha/Cr%C3%ADtica%20da%20Raz%C3%A3o%20Espiritual/?id=16200310

domingo, janeiro 11, 2015

O risco da liberdade de Imprensa

Relativamente ao atentado à "liberdade de Imprensa" em Paris, houve quem criasse o (Princípio do) contraditório relativamente às reacções de solidariedade para com o Jornal "Charlie Hebdo", coisa que inflamou novas reacções, agora para com estes mesmos "relativizadores" da (origem da) dor por tantos partilhada. Por ser igualmente um relativizador (se bem que não um dos autores referidos atrás), gostaria de esboçar rapidamente o conteúdo possível desse mesmo "contraditório".
A liberdade, móvel ilusório do ser humano, é um Princípio norteador de todas as nossas acções e, dentro dela, a liberdade de Opinião tem sido encarada como Valor inquestionável e inquebrantável. Ainda assim, obviamente que toda a liberdade se pretende "responsável" e, do mesmo modo como aceitamos aprioristicamente o Valor da Liberdade, aceitamos também o Valor apriorístico da Responsabilidade para com as opiniões, próprias e alheias, incluindo as consequências do azedume que as opiniões pessoais possam fazer criar no outro. De igual modo, a Liberdade de Imprensa convoca comummente um conjunto de Princípios de "bom-senso", sem os quais o mais inadmissível seria igualmente valorizado e publicado. Por vezes, o objecto de uma crítica faz recrutar em nós, autores (e é como autor que escrevo esta opinião), a necessidade de criar alguma dissidência, de provocar o riso ou o "grito" nos que considerarmos moral ou paradigmaticamente anquilosados. E é essa necessidade "criadora" que leva muitas vezes a escrever ou a "desenhar" qualquer coisa que, pelo conteúdo, se pode considerar como estando "no fio da navalha" entre o aceitável e o inconsequente. E é aí que regressa a questão da responsabilidade. É que o exercício da liberdade de opinião implica a capacidade de assumir um risco. Resta saber, claro, se as consequências se justificam perante a liberdade preconizada...
Obviamente, para todos nós que aceitamos o Valor prévio da Liberdade de Opinião, é praticamente inaceitável que os conteúdos publicados pelo "Charlie Hebdo" possam ou devam justificar a consequência por todos conhecida. No entanto, é provável que o grau de ofensa dos conteúdos do citado jornal seja bem maior para estes islâmicos extremistas, para os quais esta resposta "terrorista" é certamente justificada (passe-se a questão da relatividade, na verdade infantilidade, do binómio "bem" vs. "mal"). Para eles será tão "normal" esta resposta como para "nós" (supostamente, os ocidentais) é "normal" chorar o mesmo acto (e para outros "nós" é "normal" fazer o mesmo aos islâmicos, sendo que muitos já reagem com o intuito de tomarem o Todo pela parte, com a intenção "bem humana" de vingarem o terror, recriando novo terror, e descendo assim ao nível dos que se pretendem do lado do "mal").
Penso que alguns dos que "culpam" os autores dos Cartoons do ocorrido não estão a sugerir nada para além do que eu próprio sugiro (?). Não acredito que os estejam verdadeiramente a culpar, mesmo assumindo que lhes imputam o "desrespeito" pela religião alheia. Não acredito que os acusem do ocorrido, mas tão-somente de eventual "mau-gosto" (decerto eu, que, num dos meus livros, acuso Deus, bem como o seu filho, de possuir uma insuficiência fálica, também devo ter algum "mau gosto"...). Ninguém coloca em questão a existência de uma Escala de Valores. Ninguém achará decerto razoável que o exercício de uma liberdade, mesmo que com potencial "desrespeito", possa ter como consequência algo que seja mais "destrutivo" do que a acção original. Do mesmo modo, eu, que comummente digo e pratico heresias, provavelmente não faria as coisas de outro modo, não deixaria de escrever, e fá-lo-ia com a consciência das reacções. E, obviamente, não esperaria ser ferido ou morto por tal coisa, porque o acto de uma liberdade opinativa e dissidente não tem, aos meus/nossos olhos, a mesma carga pejorativa que tem um acto de morte ou terrorismo; verdade que, aparentemente, não o é para alguns islâmicos mais extremistas, para os quais a ofensa dos seus Dogmas é imperdoável. E os seus dogmas são axiais e inquebrantáveis, como o nosso Dogma da Liberdade de Imprensa e de Opinião.