segunda-feira, dezembro 14, 2009

Tensão Neural Adversa

Talvez porque as posturas de Reeducação Postural não colocam grande tensão nas estruturas neuromeníngeas, pois essas posturas de alongamento miofascial não são feitas a pensar na neurodinâmica, o mundo da Reeducação Postural e da Posturologia não tem versado significativamente sobre as questões da “tensão neural adversa” ou da “neurodinâmica”. Mas, ainda assim, as posições de alongamento das estruturas neuromeníngeas não podem ser negligenciadas, visto que a flexibilidade neurodinâmica é também uma componente do trabalho postural. Experimentemos fazer o “slump” ou a “flexão passiva da cabeça” e vejamos os efeitos que os referidos “testes” têm no aumento da própria flexibilidade mio-fascial (e outra que poderia ser referida como neuro-mio-fascial...). Daí que talvez a visão de Busquet da existência de “cadeias neuromeníngeas”, ou a visão mais global de “cadeias neuro-mio-fasciais”, esteja bastante próxima de uma realidade sincrética da Reeducação Postural.

terça-feira, novembro 24, 2009

Epistemologia e o Livre-arbítrio

A tentativa de edificar um paralelismo entre a filosofia do conhecimento – entendida aqui como “epistemologia” – e a teoria do “livre-arbítrio” releva de um conjunto de questões extremamente pertinentes para o mundo da filosofia em geral e o “submundo” da filosofia da ciência em particular. A forma como vemos o mundo e o concebemos em termos ontológicos depende efectivamente da maior ou menor precisão fenomenológica na forma como inteiramos o acto de produção científica. E, ao contrário do que poderia ser pensado, o “argumento dominador” (relativo ao determinismo vs. libertismo) jaz impertinentemente nos meandros da temática epistemológica.
Tendo sempre Karl Popper como fronteira inolvidável – própria de uma ciência dedutiva construída por propensões com vista à evolução por “falsificabilidade” – entre uma ciência observacional e uma ciência ideográfica, devemos ter em conta que existe uma barreira enorme entre a ciência própria dos neo-positivistas e a ciência “menos ciência” dos pós-modernistas.
A ciência indutiva e observacional é vista pelos cientistas – principalmente aqueles que presidem à estruturação das ciências ditas “exactas” – como sinónimo de uma Verdade única constituída por Leis, sendo que estas, por terem um certo poder preditivo, tornam o mundo pré-determinado. Bertrand Russell diz, em entrevista publicada na obra “A minha concepção do mundo” (1970) o seguinte: “Estava convencido de que todos os movimentos da matéria, a partir da nebulosa primitiva e por aí adiante estavam condicionados, e que a linguagem falada era também atingida pelo mesmo determinismo. Por isso convenci-me de que as leis da dinâmica tinham assegurado, na época da nebulosa primitiva, as palavras exactas que o Sr. A haveria de pronunciar em determinada ocasião; o Sr. A, portanto, não teria qualquer livre-arbítrio quanto às palavras que havia de pronunciar.”
É irónico que as mesmas leis da dinâmica, que a um nível macroscópico são leis de peso determinístico, tornam-se, a um nível “quântico” “leis de probabilidades”. Que é o mesmo que dizer que acontece aquilo que tem sido apelidado de “Ordem sobre o Caos”. Ou seja, leis com algum peso de determinismo e futurismo baseiam-se em movimentos tão ínfimos e tão infinitesimais (falamos de movimentos de partículas sub-atómicas) que a incapacidade de previsão de todos os movimentos leva a transformar Leis propriamente ditas em teorias de probabilidades. E quanto mais nos afundamos no nível microscópico desses movimentos, mais os mesmos se tornam indeterminados – tanto que a mera tentativa de os determinar vicia o sistema – e, aumentando o grau de indeterminismo, torna-se possível categorizar ontologicamente o Livre-arbítrio. Esta teorização – subjacente ao por muitos chamado de “efeito borboleta” – é a base do pós-modernismo, o qual, munido de instrumentos historicistas e contextuais (para utilizar a terminologia crítica de Popper em “A pobreza do historicismo” – 1957 – e em “O mito do contexto” – 1996) advoga a impossibilidade de determinação, a impossibilidade de existência de leis, e a evolução da própria ciência – ao sabor da história/cultura vigentes – por “paradigmas e revoluções” (Thomas Kuhn). Temos aqui a base daquilo que Popper denomina de “racionalismo dogmático”, que é o pré-requisito do relativismo, associados ambos – em “A sociedade aberta e os seus inimigos” (1962) – sobretudo às teorizações “políticas” de Platão e Marx.
Devo dizer que sempre achei que o erro crasso dos pós-modernistas residia no facto de acharem que existe uma igualdade entre a impossibilidade “actual” de previsão dos movimentos infinitesimais das partículas e a impossibilidade real da mesma previsão. A meu ver, o cientista poderá não ter grandes possibilidades de previsão dos movimentos dos “quanta” no momento actual, mas isso não significa que os mesmos não sejam virtualmente determináveis, num momento futuro, em que sejamos donos de instrumentos tecnológicos suficientemente sensíveis. E a possibilidade de previsão virtual dos milhões de movimentos e dinâmicas que formam o “efeito borboleta” inquinam a existência de um verdadeiro relativismo, fazendo com que, a médio ou longo prazo, as diversas ciências humanas e sociais tenham de abdicar face aos métodos das ciências exactas. Sou, portanto, dos poucos que acreditam que a consciência aprimorada que todos temos de ser livres não passa de uma mera ilusão.
No entanto, não é despiciendo o contexto discussional do pós-modernismo, principalmente aquele que é formulado em “A estrutura das revoluções científicas” (1962) de Kuhn, o qual coloca a tónica no cientista enquanto “homem”, vítima de um tempo e de um espaço contextualmente determinados.

Publicado no "As Artes Entre As Letras", 04/11/09

quarta-feira, novembro 11, 2009

Ciência e Epistemologia: dualidade indissociável

Quem acompanha o meu blog sabe a importância que dou à Ciência e às matérias epistemológicas (e a relevância que tal tem para a compreensão do 'Método' em Fisioterapia). Estou, actualmente, a publicar artigos sobre Epistemologia no jornal "As Artes Entre As Letras".
Apresento aqui um dos primeiros artigos que publiquei, nomeadamente a 07/10/09
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Ciência e epistemologia: dualidade indissociável


Desde os antigos gregos que o poder do ‘Logos’ tem sido relevado enquanto matéria quase mítica. A filosofia, e em particular a teoria do conhecimento, tem-se interessado pela Verdade, sendo que, mais tardiamente, somente no tempo de Galileu, ter-se-á inventado o conceito de “ciência moderna” (como um campo independente da filosofia). E, a partir daí, desde o século XVI, até à actualidade, a Ciência tem-se afirmado enquanto sinónimo de Verdade, baseada num sistema de leis de carácter quase inquestionável, assim como tem permitido a transformação – tanto tecnológica, quanto ideomática – do mundo.
Muito pode ou poderia ser dito sobre Ciência e o método que a consubstancia, mas, a meu ver, são três as fases fundamentais de construção de um método dito expressamente “científico”. A ciência moderna foi primacialmente substanciada pelas descobertas de Copérnico e Galileu, e epistemologicamente teorizada pelo (neo)positivismo lógico (conhecido também por essencialismo). Segundo o “clássico” método científico, a observação norteia as hipóteses científicas (princípio iniciático de Francis Bacon), as quais poderão ou não ser confirmadas pela experimentação. Esta é a ciência mais “típica”, baseada na observação e no processo de generalização indutiva, e é a força motriz das ciências ditas “exactas”. É influenciada pela filosofia analítica de Russell e pela semiótica de Wittgenstein, as quais, de certo modo, pendem mais para o empirismo do que para o racionalismo, tendo como cenário base a divisão continental clássica mais importante da história da filosofia. Foi preciso aparecer um homem de nome Karl Popper (1902-1994) para que esta ciência “indutiva” fosse questionada, assim como a tendência inequívoca dos investigadores para quererem forçosamente “confirmar” as suas teorias. Segundo Popper, e o seu método do “Racionalismo crítico”, um investigador nunca deveria fazer por “confirmar” as suas próprias teorias, pois acabará, mesmo que inconscientemente, por concluir aquilo que deseja efectivamente concluir. Assim sendo, a ciência deveria basear-se na “refutação”, na “falsificabilidade”, na tentativa de detectar erros nas teorias aceites como “certas e irrefutáveis”. A ciência de Popper é dedutiva e, apesar de o filósofo admitir a existência de uma Realidade exterior única inolvidável (adoptando um tipo de realismo científico que contraria tendências fenomenológicas e essencialmente psicologistas), toda a teoria não passa de mera conjectura, e portanto, toda a ciência possui uma categoria de efemeridade (a função do cientista passa pelo processo de aperfeiçoamento da teoria, por um mecanismo de trabalho de “tentativa e erro”). Finalmente, no final do século XX, surge, a partir do conceito de “paradigmas” de Thomas Kuhn, uma ciência dita “pós-moderna” – representada, em Portugal, por Boaventura de Sousa Santos – a qual admite que a Verdade está totalmente dependente das idiossincrasias socioculturais e pessoais adstritas ao próprio cientista. Para os pós-modernistas, existe um relativismo absoluto e não existe uma Ciência no verdadeiro e apodíctico sentido do termo.
Esta última modalidade epistemológica de ciência é comum essencialmente às ciências sociais e humanas. Nas ciências exactas, tal paradigma epistemológico aparece consubstanciado pelo “princípio da incerteza” de Heisenberg e pelo teoria do Caos (encontramos, portanto, aqui a ponte entre os dois “tipos” de ciência). Esta ciência dita “historicista” foi criticada profusamente por Popper em obras como “A pobreza do historicismo” (primeira edição de 1957; tradução portuguesa pela “Esfera do Caos”) e “A sociedade aberta e os seus inimigos” (primeira edição de 1962; edição portuguesa por “Fragmentos”), pelo facto de, pelo seu relativismo, permitir e justificar a emergência de uma ciência de “várias verdades”, portanto “não realista” e não “falsificável”.
Acabamos por ter uma dupla possibilidade de matriz de conhecimento científico: a ordem, expressa em termos de leis, com base no caos (expressa em termos de uma física dos quanta), que é própria de uma ciência dita “exacta”, e o caos com base na ordem (expressa nos termos da teoria das ideias ou essências de Platão), que é própria de uma ciência dita “relativa”. A primeira tende a ser mais apriorística e admite a impossibilidade do livre arbítrio (para esta, Deus pode mesmo estar “morto”...). A segunda tende a ser mais empirista (num sentido mais idealista, como em Hume), e admite a possibilidade de uma fenomenologia da acção irrepetível e do livre arbítrio, seja ou não de génese existencialista (para esta, Deus pode mesmo jogar aos dados ou nem sequer interferir com as nossas vidas...). Deste binómio realismo-subjectivismo ou essencialismo-pós-modernismo, resulta uma metodologia científica centrada mais nas investigações nomotéticas, naturalmente mais “falsificáveis”, ou então, uma metodologia centrada mais nas investigações ideográficas, como os “estudos de caso”, mais adaptadas à descrição de realidades singulares e irrepetíveis, que tendem a ser vistas por cientistas sociais como próprias de uma antropologia, sociologia e/ou etnologia descritiva de populações com caracteres variantes. Os dois “eixos” descritos cruzam-se constantemente, em várias ciências ainda indefinidas epistemologicamente, como é o caso da psicologia e das ciências da saúde. Mas isso é conversa longa, gerando ainda grandes polémicas...
Acontece que as diversas diferenças epistemológicas tratadas não são, infelizmente, do conhecimento da maioria dos cientistas portugueses. Aliás, pessoalmente conheci doutorados em química e física que nunca ouviram falar, por exemplo, de Popper ou do “Discurso sobre as ciências” de Boaventura de Sousa Santos. Para muitos deles a ciência continua a gerir-se pelo paradigma “positivista”. E assim sendo, o processo científico continua a realizar-se através de confirmações de hipóteses de cientistas nem sempre “inocentes”. Isto é o mesmo que dizer que, com uma ciência feita de “confirmações”, e que desvaloriza a importância do erro e da infirmação de hipóteses, os cientistas acabarão muitas vezes, mesmo que inconscientemente, por concluir aquilo que efectivamente desejam concluir (coisa que Popper denominou de “Efeito Édipo”). Tenho observado este fenómeno a ocorrer constantemente nos estudos da área das ciências da saúde e das ciências sociais e humanas. Se acrescentarmos a isto os problemas normais do “fazer ciência” (a ignorância metodológica, os erros da estatística, a falta de ética da parte das publicações demasiadamente ligadas a lóbis, os atrasos no processo de publicação e toda a catadupa da fraude – como a cópia ou o plágio, assim como a manipulação parcial de dados aquando da pesquisa, tratamento estatístico ou acto de revisão bibliográfica), acabamos por deparar-nos com a necessidade de uma Ética centrada na dualidade impartível entre a metodologia científica do cientista-técnico e a epistemologia do cientista-filósofo.
Daí que não faça sentido existirem certas disputas, assim como cientistas “positivos” fanáticos com a ideia de Leis e invariantes, ou como cientistas sociais, igualmente fanáticos, que negam a existência de uma natureza humana com certos universais. Tenho a certeza que a inexistência de uma dialéctica que caminha no sentido de uma síntese hegeliana de consensualidade advém precisamente da falta de comunicação entre o cientista e o “filósofo”.

terça-feira, novembro 03, 2009

Curso "Reeducação Postural e Cadeias Musculares": conclusão

O curso da Lousã realizou-se e parece que houve bastante satisfação no respeitante ao mesmo. Não tenho os dados da avaliação, mas, pelo pouco que vi, as pessoas pareciam satisfeitas. Houve, inclusive, várias possibilidades de troca de ideias e partilha de conceitos. Mas, como nem tudo são rosas, há efectivamente coisas que não correram na perfeição. E o aspecto que demonstrou ser mais notório foi precisamente o facto de o curso ser curto de mais para as necessidades de avaliação e intervenção postural, principalmente por parte de quem não tinha formação de fisioterapeuta. Talvez tenha o hábito de sobrevalorizar os formandos... não sei... Sei que, num curso próximo, tem de ser aumentado o tempo de avaliação e intervenção, com necessário prolongamento do curso na sua duração.
Vou dando mais notícias.
Abraços

quarta-feira, outubro 07, 2009

Curso "Reeducação Postural e Cadeias Musculares"

Ex.mos leitores

É com enorme prazer que anuncio a realização do Curso "Reeducação Postural e Cadeias Musculares", na Lousã, pela ARCIL, nos dias 30 e 31 de Outubro. O curso terá uma parte teórica - imprescindível - dedicada aos temas que tenho desenvolvido no blog ao longo destes anos - ex. método Mézières e métodos neo-mézièristas, e uma grande parte prática com tratamento de doentes e trabalho individual e em grupo de Intervenção Postural. É o primeiro grande curso no qual desenvolverei os principais conteúdos a que se dedica este blog.
O contacto para inscrição é o 239990300 ou arcil@arcil.org (Terapeuta Ana Moura Pereira). O curso tem um custo de 50,00 euros ou de 80,00 euros (se incluir refeições, jantar convívio e estadia).
Até breve

domingo, setembro 20, 2009

Saúde, políticas e economias

Numa altura em que o discurso político aparece francamente mediatizado, começo a interessar-me bastante pela filosofia política, território desconhecido de vários dos políticos "profissionais". E, no âmbito do dicurso político vigente, volto a preocupar-me com a questão da Fisioterapia e da forma como a mesma é mais ou menos valorizada pelo Serviço Nacional de Saúde. Posso dizer, desde já, que, na clínica onde trabalho, o CCR, a grande maioria dos doentes provém do Serviço Nacional de Saúde. Daí que as políticas referentes ao mesmo tenham franca importância para a minha actividade profissional. Aliás, poderei dizer que, se o Serviço Nacional de Saúde deixasse de existir para a Fisioterapia, cerca de duas dezenas de trabalhadores iriam certamente para o desemprego, eu incluído. Daí que, a determinada altura, dou por mim a esquecer o meu lado humanista, e começo a preocupar-me cada vez mais em agradar aos doentes que vêm dos subsistemas privados. Não que seja propriamente a favor da privatização compulsiva dos serviços de saúde... Mas sou a favor da manutenção do meu emprego! Portanto, a politização e a economização das vidas dos fisioterapeutas portugueses corresponde a um processo amplamente irreversível. Claro que muito poderia ser dito sobre a qualidade do SNS, sobre a utilização de um número infinito de credenciais, sobre a qualidade dos fisioterapeutas que trabalham em clínicas apinhadas de doentes... Mas, indubitavelmente, o futuro passa pela objectivação da qualidade do SNS, no seio do qual profissionais e serviços têm de ser repensados e reformulados, com vista à clarificação do Sistema e das suas potencialidades.
No próximo domingo será escolhido novo Governo. Confesso que estou cansado de ouvir sempre as mesmas palavras propaladas pelos mesmos políticos. A esquerda radical é viciada nas políticas de nacionalização, e a direita está obcecada com as privatizações... como sempre foi e continuará a ser. O país não sobreviveria a tal radicalismo. Daí que, sobrando o Centro, não posso deixar de concordar que Sócrates é o único homem capaz de moldar a imagem de uma forma que só um político talentoso consegue moldar. E, quanto mais avançam com as conversas das "escutas" e com outras obsessões do Jornal Público, jornal que, de dia para dia, caminha para a perdição, mais próximo me sinto do Eng. Sócrates. Quem me dera que o Governo deixasse de insistir na poupança dos recursos de saúde... Se existir um franco investimento na Fisioterapia, tenho a certeza que certas coisas podem mudar. E aí talvez possamos vir a conquistar novos públicos e novas facções... muito para além dos aparentemente "inúteis" idosos...

quarta-feira, setembro 09, 2009

O mundo das psicoterapias: essa grande cabala

(Texto escrito num espírito de descodificação da Realidade, com implicações para todo o mundo que temos vindo a explorar... dos paradigmas e do binómio Global vs. Analítico...).
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O texto que me proponho desenvolver é escrito por uma dupla identidade: eu, enquanto ex-doente de psicoterapia e eu, enquanto profissional de saúde, nomeadamente fisioterapeuta. Proponho uma reflexão urgente relativamente ao mundo das terapias ditas psicológicas, principalmente as de cariz psicodinâmico, as quais se têm multiplicado e globalizado neste nosso mundo crescentemente neurótico. E irei apresentar a minha defesa de que este mesmo recurso – a psicoterapia – baseia-se numa perigosa sofística, alicerçando a sua intervenção num modelo essencialmente acientífico e globalmente antitético.
Desde sempre que apresentei certos sintomas neuróticos que, mais tarde, e apesar da grande complexidade de qualquer acto de diagnóstico médico, iriam ser identificados como uma perturbação obsessivo-compulsiva. Eu mesmo, enquanto estudante de Fisioterapia fascinado pelas cadeiras curriculares de psicologia e psicopatologia, viria lentamente a aperceber-me do meu diagnóstico, segundo os padrões do manual de diagnóstico das perturbações mentais DSM-IV. Numa altura em que sofria de grandes obsessões, no formato de pensamentos ruminativos constantes e bastante pregnantes, resolvi recorrer a um psiquiatra, que, na altura, desconhecia ser igualmente psicanalista. Logo na primeira sessão que tive com este profissional, dei de caras com alguém que tinha uma poderosa gíria psicodinâmica e valorizava muito os aspectos relativos aos meus pais e à minha namorada (da altura). E foi nessa mesma primeira sessão que o mesmo profissional sugeriu que tanto a minha relação com a minha mãe como a relação com a minha namorada eram relações de conflito edipiano, dadas a um complexo de castração, do qual sofria. Tudo isso seria o barco no qual navegaria nos próximos tempos... As minhas obsessões estariam ligadas a um conflito existente entre a ansiedade de castração e a ansiedade de separação.
Não posso negar que acabei por ser contagiado por todo este manancial teorético de psicanálise e psicodinâmica. De tal forma que li incontáveis livros sobre o assunto e cheguei a fazer um ano de curso de Psicologia, assim como estudos pós-graduados na mesma área. Ora, foi nessa mesma altura, em que acumulei certos conhecimentos sobre psicologia e psicoterapia, que me apercebi que a psicanálise era apenas uma entre vários tipos de psicoterapias, havendo também terapias de segunda geração (como a terapia cognitivo-comportamental) e terapias de terceira geração.
Importa referir que, entre tantas e tantas sessões de psicoterapia analítica, as minhas obsessões nunca melhoraram significativamente. Mas, um pouco porque o psicanalista possuía um certo carácter persuasivo, lá fui continuando a fazer a minha terapia semanal (na verdade, continuei durante anos a fio). E nunca, em todo o processo o terapeuta valorizou a administração de certos medicamentos, nem mesmo quando tinha crises de obsessões e pânicos que me levavam a reflectir na solução suicida. Lembro-me que, em determinada altura, resolvi procurar uma terapeuta cognitivo-comportamental, a qual possuía portanto uma orientação psicoterapêutica diferente da psicanálise. Segundo ela, não sofria de qualquer complexo de castração, mas tinha um Eu patológico que tinha de ser “descartado” por meio da racionalização e do stop-thinking. No momento em que contei tal coisa ao meu psicanalista ele zangou-se e colocou-me entre a espada e a parede: ou ele (que não fazia separação entre o Eu normal e o Eu patológico) ou a psicóloga cognitivo-comportamental.
Fui eu mesmo que, sozinho, através das minhas pesquisas à Medline, descobri que havia medicamentos, como a clomipramina, que podiam ser mais adaptáveis à minha perturbação. Sugeri-o ao psiquiatra/psicanalista, o qual, apesar de ter passado a medicação, disse sempre que as minhas obsessões só poderiam desaparecer quando o meu conflito edipiano tivesse sido resolvido.
Houve alturas em que visitei outros psicólogos, alguns até me “venderam” as terapias de terceira geração. Mas todos os psicoterapeutas que visitava impunham-me o seu modelo, a sua arte como única e suma na resolução da minha vida. Não houve ninguém, a não ser um outro psiquiatra que viria a descobrir, que valorizasse a minha própria autonomia e o conjunto das verdades que perfazem a minha vida e a minha identidade.
À custa das teorias do meu psicanalista, fiz anos de terapia, muitas vezes sem estar medicado (pois a psicanálise seria a verdadeira panaceia!...), apesar dos queixumes dos meus pensamentos obsessivos. Somente com a administração da clomipramina acabei por libertar-me da grande percentagem dos meus sintomas, coisa com que o psicanalista não concordava de todo.
Ao final de anos de psicoterapias, concluo que não houve praticamente um momento em que a minha liberdade tivesse sido respeitada. Pois, afinal de contas, nunca pedi que a minha vida fosse mudada, somente não queria ter os sintomas neuróticos. Os medicamentos permitem-me isso e não questionam as minhas relações pessoais. É talvez necessário dizer que, entre muitas outras coisas, o psicanalista era contra a minha relação com certas pessoas, era contra certos gostos meus, para além de considerar a homossexualidade uma bizarria, as mulheres inferiores à realidade masculina, e o mundo dos fármacos como uma conspiração das indústrias.
Pergunto-me: no meio de tantas teorias, no meio de tantos paradigmas de trabalho psicoterapêutico, onde reside a objectividade, onde reside a cientificidade que justifique os doentes gastarem rios de dinheiro com a psicoterapia? Acredito que, muitas vezes, as pessoas melhoram meramente porque estabeleceram relações fusionais “protectivas” com os terapeutas (coisa que seria precisamente o lado a combater, na lógica da psicanálise), não devido à própria terapia.
Enquanto fisioterapeuta que sou, também reconheço a existência de paradigmas e modelos de intervenção no seio da Fisioterapia, mas reconheço ainda mais que a grande escolha do modelo a seguir reside nos resultados que são obtidos junto do doente. E para além disso, tentamos, na Fisioterapia, seguir, tratamentos que estejam adequadamente traduzidos numa linguagem científica e popperianamente “falsificável”.
Como fisioterapeuta de reeducação postural que sou não deixo (contudo) de questionar aqueles terapeutas que prometem corrigir grandes deformidades, e todos aqueles que desvalorizam a utilização de terapias centradas nos sintomas. É que, pela minha experiência, compreendo cada vez mais que a mudança estrutural, seja corpórea ou seja personalística, não ocorre de um dia para o outro, se é que chega mesmo a ocorrer verdadeiramente.
O controlo que certos profissionais de saúde assumem relativamente aos seus doentes ou “analisandos” é totalmente inaceitável, sendo absolutamente antitético contrariar o princípio bioético da autonomia, o qual aparece consagrado nos cânones basilares da Organização Mundial de Saúde. Aliás, já em tempos, um autor, Michel Foucault, viria a reflectir as relações entre o profissional de saúde e o doente como relações de poder, tendo dado uma nova interpretação – historicista – dos confins da “loucura” e daquele movimento que viria a ser conhecido como “anti-psiquiatria”.
Considero que a actuação do meu psicanalista, ao denegar a importância dos medicamentos para o tratamento da minha “neurose obsessiva”, foi uma forma de negligência. Assim como a tentativa de certos psicanalistas de tornarem um homossexual heterossexual, ou a tentativa de certos psicoterapeutas de intervencionarem na vida pessoal dos doentes, constitui uma forma de interferência inaceitável. Mais tarde, um outro psiquiatra viria a corroborar esta minha visão, não entendendo a atitude fanática de certos terapeutas alérgicos a uma visão mais sincrética, sintética e/ou ecléctica.
Considero, portanto, que por advogarem tantas “verdades” não científicas, e pelo grau de interferência que consubstanciam na vida dos doentes, o mundo das psicoterapias ancora numa forma de perigoso relativismo, colocando os próprios doentes em risco. Aliás, já na primeira metade do século XX, Karl Popper viria a criticar severamente a existência de certas pseudo-ciências, como a psicanálise ou a psicologia pessoal de Adler, alegando que, por tudo explicarem e por não definirem um objecto de testabilidade, certas psicoterapias roçavam os limites do desenvolvimento pré-científico, não respeitando os critérios da constituição de uma ciência adequadamente falsificável. Por outro lado, mediante certas “desculpas” de que as ciências humanas não podem ser vistas segundo os modelos das ciências exactas, e de que a personalidade humana não pode nunca ser entendida de uma forma totalmente científica – segundo o modelo de ciência moderna – tem sido permitida a emergência de um certo relativismo, actualmente mecanizado pelo pós-modernismo, o qual consubstancia o “estudo de caso” e o método idiográfico enquanto métodos “científicos”, quando, no fundo, permitem o mesmo grau de “seriedade” que vemos na astrologia ou nos livros de auto-ajuda.
A assunção de metodologias “pós-modernas” e a emergência da respeitabilidade histórica atribuída à psicanálise têm permitido um certo exercício de poder por parte dos psicanalistas, os quais se comportam como “donos da (sua) Verdade”, interferindo e manietando as vidas dos doentes de formas potencialmente danosas e eventualmente fatais. Para mim, já não faz sentido o modelo do “expert”, que exerce um certo domínio sobre o doente, fazendo interpretações “livres” dos seus comportamentos, e toldando certas decisões que só ao doente dizem respeito. O profissional de saúde, médico ou terapeuta, não é o verdadeiro decisor no processo clínico do doente. O doente é que é o verdadeiro decisor da sua saúde. Daí o conceito de “empowerment”! Cabe ao profissional de saúde aconselhar e orientar, com respeito absoluto e inegável pelo livre arbítrio do doente/cliente. Penso que os psicoterapeutas não respeitam, na sua generalidade, essa mesma liberdade individual, que um certo existencialismo sartriano tantas vezes defendeu.
Fica o meu manifesto e a urgência de atribuir aos doentes os instrumentos da sua livre perfectibilidade.

sábado, agosto 22, 2009

Sobre a higiene postural e a ergonomia posicional (enquanto ciência)

Tanto o sistema de regras de higiene postural como toda a ciência da ergonomia posicional se baseiam numa lógica de grupo difícil de denegar. Quer isto dizer que há muitos profissionais que se têm ocupado a defender o "posicionamento" correcto nas cadeiras ou nas camas, assim como movimentos ditos fisiológicos que permitam a prevenção de problemas raquidianos. Ora, se há coisa que a Reeducação Postural, enquanto método de intervenção individualista fenomenológica, não trata é de um conjunto de regras ou princípios pré-estabelecidos de posicionamento no trabalho ou na escola. Pois é certo que, atendendo ao facto de que cada indivíduo tem a sua postura definida e idiossincrática, é, por certo, estultícia e estupidez definir regras de higiene postural.
Por exemplo, os ergonomistas e os técnicos de segurança no trabalho gostam de afirmar que o posicionamento de "sentado" deve corresponder aos 90º de ângulo coxo-femural e à "coluna direita". Nada de mais erróneo... Caímos aqui no erro da lógica de grupo ou nomotética... Pois é certo determinar uma mesma postura "correcta" para um homem cuja cadeia posterior é extremamente curta e retraída e para uma rapariga extremamente flexível? Claro que não. Para o primeiro, a manutenção das "costas direitas" seria decerto um tormento, pois a cadeia muscular posterior não possui decerto a flexibilidade necessária para se manter num estado "óptimo" de contracção. Já na rapariga com grande flexibilidade (se é desse caso que se trata), o grande comprimento da cadeia muscular posterior faria com que a manutenção das costas "direitas" acarretasse um esforço bastante menor!
Ora, é portanto óbvio que os posicionamentos ditos "correctos" acarretam diferentes tipos de esforços e consequências relacionadas para diferentes indivíduos, com diferentes posturas. Aliás, a manutenção das curvaturas fisiológicas só pode ser pedida a alguém cuja flexibilidade seja suficientemente grande para que o indivíduo em questão seja portador de uma postura perfeita. Ora, na minha experiência, ainda não vi, entre centenas de pessoas diferentes, alguém que possuísse a postura de um David de Miguel Ângelo...
Daí que toda a ciência ergonómica e da higiene postural deveria passar a ser uma ciência de conotação ideográfica, adaptada às características individuais. Portanto, a prescrição de regras de higiene postural e de ordens para manter as costas num ângulo recto são, à semelhança dos exercícios dos ginásios iguais para todos (como se de um medicamento se tratasse), uma pura fantasia ingénua.
Para além do mais, a manutenção da coluna numa posição de contracção, mantendo o encurtamento dos músculos posturais, os quais deveriam ser alongados e nunca encurtados, contraria as leis do método Mézières, as quais já tantas vezes defendi.
Advogo, portanto, a transformação da Ergonomia e da Higiene Postural numa prática com vista (e análise segundo as regras da escola francesa) à avaliação individual de cada sujeito, tendo em conta as necessidades correctivas - necessariamente diferentes - de cada um. Acabe-se de vez com as "regras". E inicie-se a prática de avaliação da idiossincrasia postural de cada indivíduo, tendo em conta a necessidade de manutenção dos músculos posturais num necessário estado de relaxamento. Aliás, por alguma razão a maioria dos indivíduos não consegue corresponder à regra das "costas direitas"... E isso deve-se à fadigabilidade dos músculos tónicos... trabalhados até à exaustão porque ergonomistas ignorantes e técnicos superiores de segurança no trabalho sem formação adequada resolveram meter a mão em assuntos que não dominam!...

quarta-feira, julho 22, 2009

Uma nova interpretação da "Síndroma da Deficiência Postural"

Seria assaz estranho fazer aqui a descrição de certos tratamentos segundo Mézières, em que, dentro de determinada postura, passamos a traccionar a língua ou a alongar os músculos mastigadores. Pois é certo que a fáscia que envolve o crânio e toda a musculatura externa dos olhos e face (incluindo os músculos mastigadores), assim como a língua e certos músculos internos da zona oral, perfazem uma zona "anterior" e "limite" da cadeia muscular posterior. Em especial, a língua e os músculos mastigadores fazem a ligação entre a cadeia posterior e as cadeias anteriores. Ora, o que há a tirar daqui é de extrema importância, pois leva-nos a compreender certos casos de patologia oral e dentária, certos casos de perturbação da temporo-mandibular, certos casos de enxaqueca, certas dismetrias faciais, e certas pertubações dos músculos óculo-motores, como condições que derivam da retracção das cadeias musculares.
Por exemplo, não é comum encontrar no mesmo doente perturbações da temporo-mandibular associadas a alterações da morfologia do aparelho dentário, tendência para a sinusite e o ronco nocturno. Assim como também é comum, naqueles casos tantas vezes apelidados de "síndroma da deficiência postural" (SDP), encontrar retracções ao nível do aparelho muscular mastigador, assim como alterações da temporo-mandibular e do aparelho visual; perguntar-me-ia até se o défice de convergência ocular tantas vezes referido como causa de dislexia relativamente ao SDP não estaria associado antes a um excesso muscular dos músculos óculo-motores externos... o que me leva a pensar que o alongamento global associado ao alongamento específico destes últimos poderia ajudar tanto ou mais do que a utilização de umas lentes prismáticas (as quais utilizam, de certa maneira, a modalidade "fortalecimento muscular" como paradigma...).
É uma série de conjecturas que há que ter em conta. Mas, efectivamente, já o pai da Posturologia francesa, Bernard Bricot, incluía nos seus escritos toda uma panóplia de dados relativos à "deficiência postural" associados a dados relativos às "cadeias musculares", gíria mézièrista, portanto igualmente francófona. O que sugiro é que, tal como tenho visto em muitos dos meus doentes com SDP, não é o sistema proprioceptivo e/ou neurológico que está na base do problema, mas sim o sistema miofascial propriamente dito. Pois um encurtamento (global ou local) da cadeia muscular posterior explica as alterações na tíbio-társica, as alterações a nível dos olhos, aparelho mandibular e língua. E assim também não será difícil explicar a relação entre dislexia e dificuldades na articulação verbal. Estas últimas, ao invés de serem consequentes da primeira, seriam um mero correlato delas, no sentido em que ambas as alterações derivam de certos encurtamentos musculares sinérgicos.
Uma das razões pelas quais afirmo o que afirmo é que, em vários dos meus doentes com SDP, a intervenção segundo a Reeducação Postural leva a resultados mais promissores do que a utilização mantida de, por exemplo, aparelhos dentários, lentes prismáticas e palmilhas de infra-vermelhos. Claro que podemos sempre pensar que tudo é consequência de um défice neurológico proprioceptivo, e este sim é que leva à transformação do "ecossistema muscular". Mas ponho em dúvida a possibilidade de ser tudo ao contrário... (mais uma vez, se coloca a temática de correlação vs. relação causa-efeito; muito se sabe sobre a existência de condições simultâneas: por exemplo, a patologia dentária e a patologia mandibular tendem a ser simultâneas entre si e também com a sensação de desequilíbrio, a qual tem sido associada aos problemas da temporo-mandibular... ou será que é a retracção típica da cadeia muscular posterior que, lá em baixo, causa problemas a nível da tíbio-társica?... E a problemática psiquiátrica associada a dores na temporo-mandibular? Será causa das dores - portanto psicogénicas -, ou estas serão consequência de um estado geral de insegurança que advem da condição física?... Podíamos continuar eternamente... tudo para demonstrar que, apesar de já sabermos muito sobre determinadas relações ou correlações, muitos de nós temos a tendência irritante para inferirmos de tais correlações relações de causa-efeito, quando, na realidade, não sabemos muito bem se é o ovo ou a galinha que surge primeiro...).
De uma coisa tenho a certeza: não faz qualquer sentido os fisioterapeutas de Reeducação Postural manterem-se calados relativamente a esta tão propalada condição: a Síndroma da Deficiência Postural. Os métodos de tratamento segundo Alves da Silva podem ser interpretados segundo a lógica de Mézières e vice-versa. Mas nada me leva a pensar que os mézièristas e RPGistas portugueses conhecem Alves da Silva ou que este conheça a intervenção mio-fascial global dos fisioterapeutas. O que proponho é, primeiramente, que exista aquele estado de perplexidade, que tantas vezes possuo, derivado de tantas pessoas falarem de formas diferentes dos mesmos conteúdos. Tantos significantes diferentes para o mesmo género de semântica!... isto é sintomático não só do que falo aqui como de muitas das variadas técnicas de fisioterapia (pois, muitas delas, apesar de terem sido formadas em diferentes contextos ou por diferentes especialistas, dizem praticamente o mesmo). Eis que urge a necessidade de se criar uma parcimoniosidade (semiótica) da Fisioterapia... ou das ciências da postura em geral!... (Mas destes terrenos da "filosofia analítica" da fisioterapia já muito falei, e decerto que nada poderia acrescentar ao que já génios - como Russell ou Wittgenstein - disseram).

segunda-feira, julho 20, 2009

A legitimidade da intervenção reeducativa: relembrando Hegel

Nos últimos tempos tenho desdenhado reflectir na legitimidade de intervencionarmos no doente em termos ditos “estruturais” ou “reeducativos”. Se um doente tem determinada perturbação e procura, directa ou indirectamente, um fisioterapeuta, assumimos logo, e à partida, que existe uma condição “anormal” que teremos que “normalizar”. Qualquer acto terapêutico, assim como qualquer acto médico, é uma forma de interferirmos na “natureza” de determinada perturbação, o que nos leva a pensar que o profissional de saúde é sempre um agente de um certo artificialismo, no sentido em que se intromete numa qualquer forma de (des)equilíbrio.
No contexto da Reeducação Postural, é comum encontrarmos certos indivíduos com certas posturas que estão de tal forma “fixadas” ou “estruturadas”, que se torna relevante reflectir até que ponto devemos “interferir” naquilo que vemos. Devemos, por exemplo, deslordosar uma hiperlordose lombar que existe há décadas em determinado indivíduo? Devemos corrigir determinada cifose num indivíduo idoso que nunca fez fisioterapia em toda a sua vida? Devemos induzir alongamentos “correctivos” em indivíduos com idades avançadas que nunca fizeram ou praticaram qualquer tipo de desporto?...
Ora, é preciso entender que é, efectivamente, real que certos indivíduos se encontram fixados ou estruturados em determinados “designs posturais”, o que nos leva a pensar que, no mínimo, a intervenção postural deverá ser feita de forma lenta e subtil. Porém, não posso deixar de pensar que, independentemente do grau de “estruturação” de determinada deformidade, seria um crime não tentar interferir com esse processo, tal como seria um crime deixar evoluir um estado cancerígeno ou deixar que uma demência se instalasse mais precocemente. Portanto, o que pretendo dizer é que mesmo que a patologia postural seja algo “normal” para determinado indivíduo, não podemos deixar de tentar induzir uma nova noção de normalidade, ainda mais porque, se o indivíduo em questão nos procura, é provável que o seu equilíbrio não seja assim tão “normal” (se a dor existe, então algo a provoca...).
Ora, o que pretendo introduzir aqui é a noção de que o “conflito” poderá ser necessário à evolução. Claro que o conflito poderá ser factor de agravamento da dor... E ninguém sabe melhor do que eu que, ao invertermos a evolução de determinada deformidade postural com demasiadada celeridade, arriscamo-nos a aumentar os sintomas ao invés de os reduzirmos. Mas, aparentemente, parece que o que conta é mais a viagem do que o destino, pelo que o conflito é necessário à estruturação de uma nova personalidade corpórea (nem que seja com a ajuda de algum paliativo anti-álgico, um analgésico ou um anti-inflamatório...).
Ninguém melhor do que Hegel espelhou extraordinariamente bem a noção de “evolução por meio de conflito”. Pois, para este filósofo, a evolução do homem, e da sua História, faz-se sempre por um processo dialéctico entre um facto e outro que o contraria; algo a que, mais tarde, se designou denominar respectivamente de “tese” e “antítese”. Ora, da relação entre um factor que tende num sentido e um factor que tende no sentido que, de certa maneira, contraria o primeiro, resulta algo mais organizado, algo mais evoluído, algo que não é só a soma dos factores anteriores. A esse “algo” convencionou-se chamar-se “síntese”. E é precisamente de um conjunto de sínteses que se trata a intervenção postural no ser humano. O que fazemos é, através da exploração de uma antítese (porque contrariamos as hegemonias posturais evolutivas e ontogenéticas), por meio por exemplo da deslordose ou da expiração, induzimos ao estabelecimento de uma síntese que é, no fundo, um estado de organização que tende ao “equilíbrio muscular e postural”.
Portanto, não sei se acredito na ideia de “postura normal para o sujeito”, se essa mesma postura se se afasta muito daquilo que consideramos o “normal” (ex: a 'bela forma' de Mézières). Acredito, sim, que não devemos intervencionar doentes que não possuam manifestações clínicas ou que simplesmente não tenham pedido para ser intervencionados. Mas, se o doente me procura, terá a sorte – ou o azar – de lhe ter calhado um terapeuta de orientação “morfodinâmica”, o qual consubstancia uma intervenção a um nível mais global que as intervenções analíticas (que são, de facto, menos indutoras de qualquer tipo de conflito).
Outra coisa que deverá ser pensada é a utilização de medicamentos como factores que auxiliam a vivência do “conflito”. Se o conflito deverá ser uma condição para a produção de uma nova forma de equilíbrio mais próxima da “homeostase”, não é de negligenciar que é de todo desnecessário tentar realizar a “viagem” no sentido da “síntese” sem a ajuda de métodos que promovam a diminuição das dores. Portanto, nada impede a utilização de algumas terapêuticas anti-sintomáticas, como a medicação analgésica e/ou anti-inflamatória. Para alguns doentes, pode ser a única forma de os intervencionarmos com um nível “sofrível” de dor.
Portanto, termino dizendo que, ao potenciar o paradigma da Reeducação Postural, não me estou a opôr a outras terapêuticas “auxiliadoras”, desde claro que estas últimas não contraponham a lógica da primeira.

sábado, julho 04, 2009

Viver o seu corpo. Para uma pedagogia do movimento

É o título de um livro de Yvonne Berge. É uma obra consagrada à importância da corporeidade, num sentido epistemológico que o "nosso" Manuel Sérgio tem apresentado e desenvolvido com bastante afinco. A obra defende a ludomotricidade e a dança enquanto formas criativas e expressivas de viver o corpo, em oposição à forma mais analítica, redutora e maquinista da vivência corporal do Fitness e das práticas gímnicas contemporâneas. É impressionante a forma como é defendido o método de "libertação psicossomática" por parte da autora. Assim como eu tenho defendido que o alongamento e o relaxamento (a inibição tónica) devem principar qualquer trabalho físico, também a autora defende que, pelo facto de os utentes serem comummente tensos e defensivos, o relaxamento psicossomático deve preceder o trabalho expressivo propriamente dito. Mas, ainda antes desse relaxamento, Berge defende, como primeira fase do processo "terapêutico/criativo", a libertação da sensibilidade receptiva.
Esta libertação permitirá a "abertura" ao processo de relaxamento profundo. O relaxamento permitirá a preparação de todo o processo criativo e expressivo. E este processo que é sobretudo a dança, também pode ser a criação artística ou a psicomotricidade, desde que feitas de forma "amadora" como um meio e não como um fim.
Na primeira fase de todo o processo, a autora defende a realização de tarefas de consciencialização corporal, sem que as mesmas apelem à reflexão ou a qualquer processo racional. O processo corpóreo tem de ser basilar, carnal, animal, e não superior ou racionalista. A reflexão impede a verdadeira integração corpórea, pois a mesma trata de ser um mecanismo de defesa. O trabalho deve ser básico e simples, sem correcções posturais conscientes que apelem a um certo/errado. "Nenhuma terapia saberá vencer más posturas enquanto não se eliminar na criança o medo, a timidez, a submissão passiva, o receio de desagradar ou a ânsia de fazer correcto para receber aprovação. É indispensável criar um clima de descontração que conceda a cada um o direito de se enganar, de ser simplesmente ele próprio." Isto leva-nos a pensar que o exercício feito "correctamente" pode não ser o nosso fim. Interessa mais a sensação, a vivência criativa do corpo, feita de forma totalmente livre. Não interessa tanto fazer "bem" ou "mal", mas fazer de forma autónoma e idiossincrática. E este devia ser o espírito do processo de e-ducação, o espírito de tirar do indivíduo o que ele tem de melhor, e não de inculcar no indivíduo formas correctas e disciplinadores de "ser" e "estar". Na realidade, todo o processo educativo deveria ser o mais "livre" possível, pois a incrustação de conhecimentos vindos de fora, e de forma muitas vezes acrítica, é uma mera imposição... e que direito tem alguém de impor uma realidade a um outro alguém?...
A autora questiona também o processo de intelectualização pura, o qual é, limitador, quando não integra a corporeidade. "Quando o intelecto se torna o único ponto de referência e de valorização, opera-se uma ruptura profunda na personalidade. Perde-se toda a capacidade de espontaneidade." Portanto, não interessa um intelecto sem corpo, não interessa uma racionalidade desprovida de concreto, não interessa a reflexão se desprovida do "palco das emoções". O que não significa aceitar a corporeidade tal como é vendida pelo Fitness ou pelo Wellness, pois a vivência do "corpo industrial" não é reeducativa ou reconstrutiva mas meramente escapista.
“Pelo relaxamento descobrimos já não o corpo que temos mas o corpo que somos.” O relaxamento é um pré-requisito de qualquer tipo de trabalho expressivo. É importante a criança “abandonar-se”! “O relaxamento resulta de uma harmoniosa repartição do tónus muscular, que deverá estar: bem situado, bem doseado, incessantemente adaptado aos movimentos exigidos.” “O chão é o lugar ideal para nos descontrairmos. A sua própria dureza alivia as crispações musculares, as tensões nervosas, enquanto que, sobre uma superfície mole, esta última cede e contribui para acentuar as más posições da coluna vertebral.” O relaxamento permite descondicionar o corpo das tensões sociais e hiper-racionais, permite preparar o corpo para tornar todo o esforço subsequente fácil. O relaxamento começa com a respiração. “Uma respiração desordenada pode causar perturbações no organismo e até criar graves desordens psíquicas.” “Mas a boa respiração não se aprende; estabelece-se espontaneamente quando o corpo está bem “afinado”, completamente descontraído.”
A obra de Berge evolui para a explicação das leis da estática. Um pouco ao jeito do que temos afirmado, a autora deduz – e bem – que a região posterior do corpo está feita para a força, enquanto a região anterior do corpo está feita para a flexibilidade. Infelizmente, a autora cai no erro de Balland, segundo o qual esta tendência deve ser mantida através da prática gímnica. Ou seja, Balland defende os exercícios de força para a parte posterior e os exercícios de flexibilidade para a zona anterior do corpo, negligenciando que é essa a tendência hegemónica do corpo e que é precisamente o contrário que deve ser realizado.
O livro entra, depois, nas actividades lúdidas, como a dança e o treino de equilíbrio, as quais estão correctas num certo ponto de vista, mas nunca no ponto de vista segundo o qual estas actividades permitem "fortalecer" a extensão e o endireitamento. O pré-requisito continua a ser o alongamento posterior; o trabalho lúdico-motor apenas potencia a relação harmoniosa com o todo e com a entidade postural entendida no sentido psicossomático.

domingo, junho 21, 2009

Dia mundial do Yoga

Dia 21 de Junho é o dia mundial do Yoga, o qual tem sido anunciado com uma certa rejubilação nos órgãos publicitários mais mediáticos. E dia 21 é também um dia triste para a Saúde mundial, pois, sendo esse mesmo dia dedicado a uma prática que fundamenta a destruição voraz das estruturas ósteo-articulares dos praticantes, este mesmo dia fica, de facto, consagrado à geração Yoga, que podia ser também a Geração 'Estética corporal', que também poderia ser Geração 'Holmes Place' ou 'Viva Fit', Geração 'Fitness' ou Geração 'Wellness'...
Enquanto fisioterapeuta de Reeducação Postural que sou, e sabendo que a saúde reumatológica dos potenciais pacientes que todos somos depende do normal ou anormal estado de tensão das estruturas de tecidos moles que envolvem as articulações, tenho defendido com persistência que a prática contínua de desportos que importancionalizam o trabalho de força, ou então a prática de actividades milenares que desconhecem as bases científicas que permeiam a diferença entre musculatura tónica/estática e musculatura fásica/dinâmica (como o Yoga ou o Chi-Kung), leva inevitavelmente, no longo prazo estrutural, à destruição do “corpus” frágil que todo o ser humano constitui.
É com pena que vejo que, neste nosso contexto 'neoliberal' de frio calculismo mercantil, se tenha criado e consubstanciado um mercado corporal de práticas rituais que, ao invés de propiciarem a verdadeira saúde holística do corpo, propiciam o escapismo e a destruição pela esteticização compulsiva, dando origem a um produto que é na realidade o dos futuros clientes dos fisioterapeutas.
Defendo e tenho defendido que vivemos nos auspícios de uma “indústria do corpo”, que torna o objecto corpóreo, palco do sofrimento psicossomático, vítima de mercados e instituições de puro cinismo lucrativo, sendo que três 'indústrias' são particularmente afamadas: o wellness, as medicinas não convencionais e o fitness. Todas elas têm em comum servirem-se de uma capa de “trabalho de e para a saúde”, com base em estudos científicos que são na realidade pura barganha de 'massa' quantificativa e pobre riqueza conteudística e metodológica, quando, no fundo, arrogam-se a destruir o corpo e a criar a dependência das suas próprias práticas, o que é defensável para o objecto do nosso mundo puro do Capital.
Este, e em especial os produtos quiméricos e um tanto “místicos” como o Yoga, são na realidade o exacerbar do espírito das “Indústrias culturais”, tal como foram compreendidas pelos filósofos pós-marxistas da escola de Frankfurt.
O Yoga exemplifica vivamente o que me pretendo defender. É, supostamente, uma prática milenar centrada na saúde psicofísica do utente. As suas posturas, a sua respiração e, em geral, a sua filosofia, consubstanciam a saúde corpórea global ao mais alto nível. Mas, na verdadeira realidade, qualquer fisioterapeuta reconhece nas ásanas (posturas) do Yoga uma potencialidade destrutiva das articulações sem qualquer margem para limites. Por exemplo, as “torções” e as “invertidas” são perigosíssimas para possíveis e potenciais hérnias discais; as “extensões” comprometem a saúde postural, fortalecendo a cadeia muscular posterior, rica em músculos hipertónicos de grande tensão, que se queria refreada. E a presunção de que o instrutor de Yoga prescreve a diferenciação idiossincrática e potencialmente casuística dos seus utentes ou alunos é pura falácia, pois estas várias práticas, que de Fitness se tratam, apresentam-se particularmente massificadas, criadas para grupos em que não faz qualquer sentido encarar a Verdade fenomenológica do utente.
O dia mundial do Yoga representa, portanto, o dia do Corpo frágil, no sentido em que, sob a capa de um poderoso conteúdo comercialista e um intrépido produto da Imagem propiciada pelo frio 'marketing', esta prática, tal como tantas outras supostamente sábias porque ancilares, alimenta a patologia, sob o disfarce da saúde, a qual se confunde com a diluição de sintomas físicos, esta muitas vezes só e meramente “efeito placebo”.
Tudo aquilo a que me refiro foi bem definido por Baudrillard na sua “Sociedade de consumo”, o qual argumenta que a descoberta do corpo, “após uma era milenária de puritanismo, sob o signo da libertação física e sexual, a sua omnipresença na publicidade, na moda e na cultura das massas – o culto higiénico, dietético e terapêutico com que se rodeia, a obsessão pela juventude, elegância, virilidade/feminilidade, cuidados, regimes, práticas sacrificiais que com ele se conectam, o Mito do Prazer que o circunda – tudo hoje testemunha que o corpo se tornou objecto de salvação, substituindo literalmente a alma nesta função moral e ideológica. Significa isto que o corpo não é uma evidência, o corpo é um facto de cultura.”
Também José Gil, no seu “Metamorfoses do corpo” diz «Assiste-se actualmente, depois do esforço psicanalítico, a uma verdadeira invasão do culto do corpo – visível, sobretudo através das dezenas de métodos terapêuticos que florescem nos Estados Unidos. Pretende-se fazer falar o corpo, descobre-se a propósito de tudo e de nada “um discurso do corpo”, pretende-se que ele se liberte ou se exprima. Como se o objectivo fosse, neste momento, descobrir uma língua do corpo à qual se subordinaria qualquer terapia ou outra forma de linguagem: artística, literária, teatral ou simplesmente comunitária. Muito estranhamente, na mesma altura em que esta voga testemunha uma sensibilização crescente pelos problemas do corpo tendente a afirmar a sua importância nos mais diversos domínios, retomam-se velhas ideias, velhos esquemas – idênticos aos regimes de signos que serviram para a exploração do corpo: este tornou-se o significante despótico que resolverá tudo, desde o declínio da cultura ocidental até aos menores conflitos intra-individuais. Uma tal concepção seria inofensiva se não fizesse passar o corpo por o significante supremo que, recobrindo um vazio, faz as vezes de tudo aquilo de que os nossos corpos foram desapossados – pelo menos desde a desagregação das culturais arcaicas. Que corpo é este, em volta do qual se agitam estas terapias? Uma análise superficial revelaria neste campo uma maneira de fazer violência aos corpos – tomando, às vezes, as formas mais nuas de cinismo mercantil.»
Como concordo com este conceito de violência!... Como se me agita a necessidade de constituição de uma nova epistemologia da postura e da motricidade, uma renovada teoria da corporeidade e uma completamente revolucionada metodologia do desporto e da ciência – supostamente rigorosa – que o consubstancia!...
O dia mundial do Yoga representa tudo aquilo que o Corpo é na sociedade actual: um objecto que já não somos, somente temos e consumimos.

sábado, junho 13, 2009

Sobre a importância do Conceito na Fisioterapia

A divisão marxista das profissões em trabalhador intelectual e trabalhador manual implica, de certo modo, uma certa elisão ou clivagem entre duas grandes categorias de actividades: as actividades francamente conceptuais e noéticas e as actividades mais corpóreas. Não denego a importância de se conceber a unidade do concretismo corpóreo na actividade de fisioterapeuta, ainda mais se essa unidade incluir a expressividade e a dramaticidade artística. Mas, reduzir o fisioterapeuta a um profissional que é mero "corpo", corpo de trabalho manual, é privar o mesmo de uma certa capacidade de avaliação de cada segundo de intervenção no doente, assim como é privar a capacidade básica de decisão, a qual está implícita no mais pequeno gesto terapêutico. Daí que ache que o fisioterapeuta deva, por princípio, ser, antes da sua constituição enquanto "trabalhador manual", um pensador, um filósofo. Pois o número de questões a serem pensadas e refreadas é imenso! E o fisioterapeuta nunca poderá constituir um bom profissional sem se acercar de um conjunto de questões teoréticas que esboçam a Teoria fundamental e parcimoniosa da decisão e acção terapêuticas. O mesmo será dizer que é importante que o fisioterapeuta não tenha medo de possuir conhecimento ao nível da epistemologia ou da literatura e das artes, visto que estes mesmos conhecimentos, não só vão transformar o fisioterapeuta num agente autónomo, como só poderão ajudar a promover o fisioterapeuta junto de outros profissionais de saúde.
É por tudo isto, e muito mais, que continuo a resistir à simplificação e estultação da minha linguagem, pois acho que os fisioterapeutas precisam verdadeiramente de se aculturarem. É certo que temos milhares de fisioterapeutas a possuírem pós-graduações e mestrados, mas estas formações académicas são de teor institucional, necessariamente científico; ou seja, o ensino pós-graduado ajuda a formar investigadores, mas não faz dos fisioterapeutas bons pensadores, pois esse mesmo ensino, ao colocar-se nas efígies da actividade científica, evita qualquer teor mais conceptual, porque potencialmente especulativo. É certo que teorias e conceitos podem abranger a subjectividade, a um nível de possível delírio, mas o evitamento da actividade mental especulativa leva a que os fisioterapeutas percam a sua capacidade de "pensar" na totalidade da Fisioterapia enquanto matéria Una e parcimoniosa, e também leva à incapacidade de conceber o doente enquanto "ser que existe" (Sartre), "ser com intencionalidade" ou Ente (Husserl), ou, então, Dasein (Heidegger), ou seja, enquanto Indivíduo com características únicas e irrepetíveis, ligado a um mundo de questões que devem ser pesadas e reflectidas.
Este mesmo mundo da reflexão em torno do "Ser", num sentido mais individual do que colectivo, esboça a necessidade de uma "filosofia da fisioterapia", a qual não é apanágio conteudístico dos cursos de licenciatura, mestrado ou doutoramento, sendo que estes, não só denegam todos os métodos fisioterapêuticos que são mais Arte que ciência (como a Reeducação Postural), como cegam os seus formandos à realidade científica (no sentido mais essencialista e neo-positivista possível), apresentando-a como única forma de interpretar a realidade.
Ora, na realidade, alguém que possua uma perspectiva mais "morfodinâmica" do corpo sabe que a Ciência consubstancia uma forma um tanto parcelar de ver os utentes. Basta o facto de a ciência ter unicamente validade estatística e probabilística para atendermos à sua grande limitação, pois se, por exemplo, em determinado estudo, for obtida uma prevalência de dor lombar em metade dos utentes escolióticos avaliados, ao invés de se suplantar a existência de 50% de indivíduos sintomáticos, mais importante será concentrar-nos na realidade única de cada um dos 50 indivíduos que, apesar de possuirem deformidade, não possuem queixas dolorosas. Ou seja, o estudo demonstraria que em cerca de metade dos casos terá de se entender o fenómeno de uma potencial adaptação patológica mas "natural", que faz com que os indivíduos se tornem um anti-essencialismo.
Que as graduações e pós-graduações criem condições de reflexão, mas verdadeira reflexão especulativa! Pois são tantos e tantos os pós-graduados, assim como são tantos aqueles que vêm ter comigo com formações de 'RPG', 'Cadeias Musculares', 'Sofrologia', e todo um emaranhado de porcarias que enchem o currículo, e, quando falam comigo ou pegam num doente, demonstram que nada entenderam da Essência mais pura do conceito da Reeducação Postural.
Que se finalize esta tendência para as pessoas se encherem de cursos atrás de cursos, graduações e pós-graduações. Estão a querer provar o quê a quem? À sociedade? Que se lixe a sociedade e o seu lixo nesciente! Demonstrar que se possui uma verdadeira maturidade intelectual implica que nem sequer nos preocupemos com o que pensam as maiorias. De certo modo, o homem que é verdadeiramente inteligente, ao jeito de Sartre, refuta as tendências das massas, esse lixo acrítico que só quer material de conhecimento "sem conteúdo". O homem verdadeiramente inteligente prova-o com os actos e com o discurso. Não o prova coleccionando formações ou pós-graduações, sendo que as mesmas não passam de um método utilizado pelas Universidades para "fazer render o peixe". O homem verdadeiramente inteligente é insaciável! Dispensa os formadores. Dispensa as instituições. É anárquico, no sentido em que luta contra as estruturas. O homem verdadeiramente intelectual não cessa de fazer construções, elaborações internas gestálticas, e fá-lo de modo autónomo, crescendo exponencialmente sem necessitar de títulos ou diplomas que só têm importância aos olhos da sociedade estulta.
Que se façam fisioterapeutas com esse aparelhado, com essa capacidade de pensar e de fruir da Verdade mais significante das coisas. No sentido dado por Ibsen, que se faça um "Inimigo do povo". E aí sim!... Teremos o verdadeiro intelectual da Fisioterapia!

quinta-feira, junho 11, 2009

Manifesto de um fisioterapeuta de Reeducação Postural sobre as artroses

As artroses, assim como as diversas variantes de artropatia degenerativa, são o resultado do acumular de diferentes factores nosológicos de importância reumatológica. Mas, na maioria dos casos, a presença de artroses específicas explica-se pela existência de determinada postura ou alinhamento. Pois é verdade, por exemplo, que o alinhamento do membro inferior condiciona a maior ou menor compressão de certas superfícies articulares. O alinhamento da articulação tíbio-társica e da articulação do joelho (nomeadamente, a fémuro-tibial) está fortemente relacionado com o alinhamento geral do membro inferior. E este mesmo alinhamento está relacionado fortemente com o estado de tensão das estruturas musculares. Por exemplo, a postura do pé ou da tíbio-társica depende muito do estado de tensão do tendão de Aquiles e da fáscia plantar, os quais podem ter ou não uma grande ligação com o estado de tensão da restante cadeia muscular posterior. A postura do joelho valgo vs. varo tende, geralmente, a relacionar-se com o estado de tensão das estruturas musculares que pertencem à geografia muscular do joelho. O varismo, mais comum nas senhoras de idade, tende a estar associado a um maior estado de tensão dos abdutores e/ou da banda iliotibial, enquanto que o valgismo relaciona-se mais predominantemente com a retracção dos adutores e/ou também com a retracção da banda iliotibial. O joelho recurvatum tende a provocar lordose lombar excessiva e/ou lordose dorsal. Por outro lado, o estado de conflito da articulação do ombro (conflito sub-acromial) ou da articulação da anca tende a estar associado respectivamente à cifose dorsal e à hiperlordose lombar com báscula anterior da bacia. Daí que um problema de coluna, associado a uma hiperlordose lombar e/ou dorsal, se relacione muitas vezes com a artrose da anca. Mas, no meio de todo um conjunto avultadíssimo de possibilidades, podíamos continuar eternamente a referir exemplos de possíveis correlações, que provavelmente não possuem verdadeiro significado científico (pois, na prática, há todo um conjunto multimodal de casos possíveis, sendo que é sempre preferível conhecer a integralidade da postura de cada doente individualmente, sempre com base numa filosofia de observação e análise idiossincrática).
Mas de uma coisa eu tenho a certeza: é que os diferentes sistemas de eixos de alinhamento da coluna e dos membros, os quais se influenciam uns aos outros, vão condicionar um funcionamento vicioso da articulação, com possibilidades de perturbação biomecânica. Ora, é muito comum os fisioterapeutas realizarem trabalho de mobilidade da articulação com artrose. Considero que tal prática é um erro. Ora, se a articulação possui um alinhamento vicioso, isso significa que o trabalho funcional dessa articulação sem realinhamento prévio pode representar uma sobrecarga de determinadas estruturas articulares. Vejamos o exemplo do joelho valgo. Este significa a existência de uma maior compressão das superfícies articulares externas da articulação fémuro-tibial. Ora, sempre que o doente realizar alguma tarefa funcional, por mais simples que ela seja (exemplo: andar), o doente estará a desgastar aquelas superfícies articulares. Daí que, para mim, é preferível, ao invés de trabalhar, dia após dia, a mobilidade e força daquela estrutura, propiciando grande sofrimento ao doente, mais vale tentar influenciar o sistema de eixos da articulação... desde claro que se entenda o que se está a fazer. Daí que, por mim, realizaria um trabalho de alongamento global, pelo menos da totalidade do bloco inferior da cadeia muscular posterior, tentando propiciar o realinhamento do joelho (mesmo que munido de algum conjunto de manobras mais analíticas de terapia manual... sempre dentro da postura global). Só depois de o ecossistema muscular do joelho ter sido relaxado (e o tónus inibido) e o alinhamento ter sido readquirido (mesmo que parcialmente) é que faz sentido dar mobilidade aquele joelho artrósico.
As artroses são, em todos os indivíduos, uma potencialidade, visto que todos possuímos, em maior ou menor nível, um jogo viciado de tensões musculares e de compressões articulares assimétricas. Somente num indivíduo com equilíbrio angular total, alinhamento absoluto, e total simetria corpórea, o jogo de tensões articulares estaria saudavelmente distribuído. Aí, era preciso que os outros factores contributivos para a artrose - factores hormonais, osteoporose, obesidade, etc. - fossem de expressão muito elevada.
A realização de uma Fisioterapia centrada na mobilidade articular sem prévio trabalho postural é, a meu ver, um absurdo. E, se essa Fisioterapia incluir o trabalho de força muscular, o absurdo é ainda maior, pois esse trabalho de força leva ao aumento do jogo total de tensões musculares (fortalecem-se músculos fracos, mas também se fortalecem músculos hipertónicos das cadeias musculares, pois, como já foi explicado em vários sítios, o princípio do isolamento do trabalho muscular não passa de um mito), contribuindo para fomentar mais desequilíbrio e mais desalinhamento. É certo que uma articulação com artrose é geralmente uma articulação com músculos fracos, mas essa fraqueza tem mais a ver com a fraca qualidade de alinhamento articular, e portanto com a fraca capacidade funcional da articulação, do que com uma real falta de potência muscular. Se o equilíbrio e o alinhamento forem readquiridos, a articulação aumenta a sua capacidade funcional, aumentando automaticamente a força dos seus músculos pela "normal" prática funcional.
A ordem que defendo para a "prescrição" de um trabalho fisioterapêutico para uma articulação com artrose é a mesma que defendo para o trabalho geral em Fitness: alongamento » mobilidade » força » alongamento.
Sei que o tempo que o Sistema nos delega aos doentes não permite o trabalho postural verdadeiramente abrangente, mas como seria bom realizar umas quatro ou cinco sessões bem feitas, com princípio, meio e fim, do que dezenas e dezenas de sessões multiplicadas, constituídas pelo exercício mormente activo (visto que o terapeuta pouco tempo tem para tocar no doente).
A visão das artroses como resultado de desequilíbrios musculares e de uma distribuição assimétrica das forças, associada ao desalinhamento do sistema de eixos articulares, leva, a meu ver, à revolução na forma como são tratadas, não só as artroses, mas a totalidade das artropatias. Por outro lado, o trabalho postural global poderia, a meu ver, prevenir uma boa parte das artroses que se acabam por desenvolver, assim como acho que, no sentido oposto, o trabalho muscular intrépido associado às práticas desportivas modernas e massificadas, poderá levar ao desenvolvimento mais célere da patologia degenerativa.
No meu mundo eutópico, a intervenção postural com base nos métodos holísticos e mézièristas de alongamento global, será suficiente para preservar ou corrigir (mesmo que parcialmente) o bom estado de simetria e alinhamento de um corpo, em que o jogo de forças será o mais perfeito possível.

sexta-feira, junho 05, 2009

Paradigmas e fanatismos

Muitas vezes tenho sido acusado por colegas de possuir um certo fanatismo relativamente ao modelo da Reeducação Postural. Ora, acontece que, longe de querer negar que, por vezes, sou um pouco radical, devo dizer que é bastante comum o profissional de saúde especializado funcionar segundo um modelo preciso. É que, por qualquer razão, mais de teor subjectivista do que objectivista, o proponente de determinada teoria ou modelo tende a agarrar-se a ele como se a fidelidade ao mesmo fosse a razão de ser e de se "manter" (seguro de si).
Eis que surge o momento de dizer que também eu sei e consigo atender à possibilidade de que a Reeducação Postural possa não significar a resposta para tudo. Um exemplo que considero constituir uma contra-indicação ao trabalho de Reeducação Postural é a presença de hérnia discal com nevralgia. Há uma certa tendência para a intervenção postural não abonar a favor de ciáticas ou braquialgias. E, portanto, neste domínio, acabo por preferir a realização de algum tipo de terapia manual. Por outro lado, também não há razões para negar a pertinência de imiscuir métodos diferentes ou técnicas aparentemente contraditórias... desde, claro, que não se dê "uma no cravo e outra na ferradura".
Daí dizer que há casos que, pela sua gravidade, impedem a efectuação de certas posturas, assim como, no campo neurológico, nem sempre é possível realizar uma intervenção qualitativa com base no equilíbrio, simetria e evitamento de compensações. Vejamos o exemplo de um indivíduo que possui parcas capacidades de recuperação. Ou vejamos a situação de alguém, que até possui algumas capacidades para se adaptar ao modelo de intervenção segundo Bobath, mas que, pelo facto de possuir uma certa emergência de realização de funções e de obtenção de autonomia, não pode ser incluído no nosso trabalho.
No mundo da Reeducação Postural tenho notado, por exemplo, que há pessoas que possuem certas posturas que, apesar de necessitarem de ser contrariadas, acabam por resistir fortemente a qualquer tipo de tratamento morfodinâmico. Ou seja, por vezes, encontramos indivíduos cujas estruturas são de tal forma "anquilosadas" que não é possível fazer promessas "infantis" relativamente a uma transformação postural cabal. Temos, portanto, de ser capazes de reconhecer que há situações que não podem mudar de um dia para o outro, ou que não podem mudar de todo. Tal como no âmbito psiquiátrico, não podemos esperar que uma personalidade se reestruture abruptamente, se é que não haverá casos em que é impossível obter mudanças significativas na estrutura personalística...
Há, portanto, pessoas que estarão condenadas a ganhar mais com os calores húmidos, as massagens e os medicamentos, do que propriamente com uma intervenção mais globalista. Há pessoas que se adequam melhor ao "crack" de um terapeuta manual ou de um osteopata do que propriamente ao trabalho de "libertação mio-fascial". E o que é certo é que, por vezes, há possibilidades de, arrumando os doentes nos diferentes paradigmas segundo o que vemos e avaliamos inicialmente, errarmos na escolha do modelo. Por exemplo, determinado indivíduo com grande tensão muscular e/ou escoliose pode ser visto como estando adaptado ao modelo da Reeducação Postural, mas, com a evolução de todo o processo, acabamos por perceber que as dores que a pessoa (in)suporta não justificam o trabalho que está a ser realizado. Portanto, não deixo de compreender aquelas pessoas que preferem um anti-inflamatório ou a acupunctura relativamente a um fisioterapeuta de globalidade, assim como há pessoas que reagem melhor à simples massagem do que a um trabalho de alongamento mio-fascial.
Interessa, portanto, compreender que: (1º) Não há verdades absolutas, há sim várias verdades, várias "epistemis" (Foucault) e vários "paradigmas" (Thomas Kuhn); (2º) Importa incluir o doente adequado, com a condição adequada no modelo de trabalho igualmente adequado; (3º) Tal inclusão respeita não só ao que é decidido inicialmente como no respeitante à evolução da condição, o que significa a necessidade de o fisioterapeuta (e, por isso mesmo, apenas ele...) ter de reavaliar a situação continuamente; (4º) A escolha do modelo de intervenção cabe não só ao profissional de saúde como ao doente, visto que é este que tem determinados objectivos, planos de vida, necessidades de maior ou menor autonomia e/ou expectativas determinadas; (5º) Nada impede o trabalho multimodal, com inclusão de mais do que um tipo de intervenção, desde claro que as intervenções diferentes não sejam mutuamente exclusivas (tratar uma hemiplegia com recurso a Bobath e Constraint-Induced Therapy e logo a seguir treinar a função do lado remanescente é, claro está, incoerente! Ou, por exemplo, tratar um doente com lombalgia com recurso a Mézières ou ao RPG e depois fortalecer os extensores dorsais releva-nos para o campo da incompatibilidade metodológica); (6º) Nada impede o trabalho multidisciplinar, apesar de que, a meu ver, é sempre bom quando um profissional com que o doente se identifique mais assuma o papel de protagonista do processo de intervenção.
Apesar de não deixar de ser fiel ao meu modelo, e de acreditar na possibilidade de o meu modelo explicar coisas que outros modelos não explicam, nunca poderei esquecer a "história da sangria" que me foi contada uma vez por determinado mestre: um doente do século XVIII foi tratado com recurso à sangria, tendo, mais tarde piorado. Os médicos da altura aumentaram o número de sangrias, e o doente continuava a piorar. Até que um dia o doente morreu. E o que é que os médicos concluíram? Que não realizaram sangrias suficientes!...

domingo, maio 31, 2009

Viver saúde (2)

Ontem fui efectivamente ao Viver Saúde na FIL. Entrei por volta das 15h30. Saí por volta das 15h50. Em toda a minha vida nunca gostei muito de supermercados e aquela Feira não passa disso mesmo: de um verdadeiro mercado do corpo. As várias terapias - serão assim tão diferentes umas das outras?... - são promovidas como uma forma de escape face ao mundo, como a solução única e prometedora de cura total de mente e corpo. Camas ortopédicas com efeito vibratório, plataformas vibratórias que, supostamente, ajudam a perder peso, lipoaspiração com laser, terapias não complementares à base de massagens, que mais parecem amassamentos de pão que se prepara para o forno, terapias com pedras e spas libertadores... todas estas terapias competem entre si para erradicar o ser da sua própria unidade. Ao invés de se promover a capacidade de se ouvir o próprio corpo e de se promover a resolução dos conflitos psicofísicos (os quais não podem ser feitos sem um certo nível de "sofrer"), promove-se o escapismo total, a fuga aos problemas e a fuga à (auto)consciência. Estas terapias não promovem a reconstrução do Esquema corporal, promovem a construção de um ser sem corpo e sem expressividade, como se o corpo fosse um inimigo a abater que é a causa indissolúvel dos problemas pessoais.
E depois temos os Pilates, os Chi-kungs, o Fitness na sua mais árdua expressão, em que qualquer semelhança com a lógica do produto e do mercantilismo abrasador é pura coincidência. Aquelas músicas altíssimas, aquela ausência de arte, aqueles exercícios sincopados e massificados, aqueles desportos de violência intrépida... Enfim, quando entrei naquela Feira senti-me como um judeu que visita um campo de concentração. Senti-me profundamente deprimido, por ver quanto a humanidade se perde. É o mesmo tipo de depressão que sinto quando um doente que se adapta ao meu trabalho, ao final de uns meses, me pergunta se agora pode ir para a natação ou para um ginásio de musculação (é a angústia de saber que - apesar de tanto esforço - não consegui passar verdadeiramente o meu conceito ao doente). E os próprios terapeutas?... Fazem formações atrás de formações, não sei se aprendem se sub-aprendem. Fazem os Pilates e os vários tipos de massagem, contribuindo para desintegrar a verdadeira ideia de Corpo como um Todo, uma unicidade fenomenológica que não pode ser reduzida a "tipos" vários de terapias. O bom terapeuta é aquele que reconhece um paradigma no seio de um doente determinado, não é aquele que faz tudo e mais alguma coisa. A meu ver, a super-formação não faz de um terapeuta um verdadeiro terapeuta. O bom terapeuta define-se pela capacidade que tem de experienciar a factualidade do doente e do modelo em que melhor se insere. Portanto, o nosso trabalho só faz sentido se for autónomo, e livre de comercialisses, nomes e mais nomes de técnicas e super-especializações; o nosso trabalho só faz sentido se o doente tiver em mente a transformação plástica e inventiva do doente, independentemente das porcarias que são inventadas e vistas pelos formadores como uma "panaceia".
Sim, meus senhores, caminhamos para um mundo em que a lei do economato toma todas as mentes, praticamente sem excepção, e transforma-as em agentes passivos e sem capacidade expressiva. As diversas formações existentes no campo da Fisioterapia são mais a expressão de um negócio, de um produto, de uma falsa sistematização, do que da Verdade do raciocínio e holismo que se pretende num Terapeuta Global. É, mais uma vez, a sociedade do espectáculo e da indústria a ter prevalência sobre a antiguidade clássica e verdadeiramente Global. Viro-me para onde me virar, não vejo um único terapeuta interessado em ler, estudar e pensar. Só vejo terapeutas interessados em fazer formações e pós-graduações, umas atrás das outras, como receptáculos de um conhecimento recebido acriticamente. Não há "Inteligência" no mundo dos Terapeutas. Por mim, sinto-me bastante sozinho nesta tarefa de agente pensador e crítico do mundo que me envolve. E sinto, cada vez mais, que a distância entre o fisioterapeuta, o instrutor de Fitness, o massagista e a esteticista é cada vez menor. É uma sensação de desolação, de insularidade total... uma angústia e uma solidão ímpares. Mas de uma coisa não tenho dúvidas: prefiro esta angústia, esta consciência, a cair na mentira e na alienação em que caem os proponentes da lógica do mercado. Prefiro viver desolado a anti-depressivos do que ser mais um entre uma indústria de autómatos - aparentemente saudáveis - tomados por um autismo com aspecto de oligofrenia. Sim, nós os portugueses estamos crescentemente mais próximos da lógica anglo-saxónica, estamos verdadeiramente a perder a nossa identidade cultural. E ainda dizem que a Globalização é uma utopia... A Globalização está a destruir-nos e a desagregar a Unidade e a complexidade do Ser. Aqui entre nós, apenas rezo a Deus para que nunca me deixe cair na tentação de perder a minha identidade e a minha idiossincrasia, pois a "Traição do Eu" e a "Loucura da normalidade" (Arno Gruen) são realidades cada vez mais irreversíveis.

sábado, maio 30, 2009

Viver Saúde

Mais uma vez, mais um ano! Viver Saúde apresenta-se-nos na FIL com uma série de produtos - que é mesmo disso que se trata - vocacionados para o trabalho corpóreo, seja numa componente de saúde complementar, seja numa componente de Fitness. É engraçado ver que as grandes empresas estão lá todas: a Manz, o Pilates Institute, o Pilates Studio, o Instituto de Medicina Tradicional, o Instituto Português de Naturologia... e é de tudo isto que se trata verdadeiramente aquilo que - à semelhança do meu artigo na 'Vértice' - denomino de "Cultura do Corpo e Sociedade de consumo". A maioria destas práticas não permitem a verdadeira "reconstrução psicofísica". São produtos, são modalidades, como se fossem uma ementa de pratos de um restaurante, cujo objectivo é alimentar... alimentar, cada vez mais, a ilusão, a desconstrução e a entropia do sujeito face à desagregação do corpo em capítulos e/ou "escolhas", quando, no fundo, o corpo é um só. Dar ao corpo massagem com bambús ou uma sessão de "privação sensorial", ou uma terapia quântica... fica bem fazer estas coisas como quem vai aos cabeleireiros de luxo, aos spas de referência, ou se hospeda nos hotéis mais luxuosos. Por mim, eu que prefiro as salas bafientas do King às salas pipoqueiras comerciais em matéria de cinema, nesta nossa modernidade vencida pela lei do economato e a lógica do marketing, não posso deixar de ver este ViverSaúde como uma Feira do Relógio, que vende produtos e soluções de bem-estar, sempre uma promessa de salvação face ao mundo "exterior" cheio de agressões. E são poucos os que vêem nestas práticas aquilo que eu vejo: mais uma agressão da parte desse mesmo mundo de intrepidez.
Defendo o regresso ao purismo, à visão parcimoniosa do corpo e da saúde, à simplicidade complexificadora do Corpo Uno e Holístico... pois, no fundo, as coisas são tão simples. E o doente, face ao verdadeiro terapeuta, será sempre alguém cuja solução terapêutica - nunca sendo simples - passa por um caminho, por uma evolução, tão melódica e lenta como a evolução da natureza e o desabrochar de uma flor. Nada de soluções rápidas e milagrosas, nada de sapiência ao desbarato, exposta numa feira de esteticização. O trabalho em saúde está, a meu ver, mais próximo do trabalho do historiador que procura e pesquisa em livros bafientos que já ninguém lê ou prescruta. A cultura dos clássicos é a minha forma de estar na vida e, a meu ver, estes terapeutas pretensamente holísticos destas "feiras da saúde" fazem jus aos médicos de Molière. É a cultura da imagem e da beleza. Mas nem é uma beleza conformada ao conteúdo clássico, é uma beleza feita de artimanhas psicológicas e de estratégias mercantilísticas unidas a uma poderosa lógica utilitarista (quantos mais convencemos mais temos e ganhamos).
Enfim!... É a cultura do efémero, do escapismo e do hedonismo. Já Aristóteles foi bastante claro em referir que a felicidade não tinha nada a ver com prazer, mas sim com equilíbrio... o mesmo equilóbrio que falta neste nosso mundo que mais parece uma praça em que cada peixeira grita mais alto que a outra para vender o seu peixe.
O trabalho em Reeducação Postural, para quem o conhece verdadeiramente, não é fogo de artifício, a não ser que consideremos um espectáculo a normal evolução de uma natureza selvagem e singela. Que tenhamos respeito por essa naturalidade intrínseca das coisas...

segunda-feira, maio 25, 2009

De encontro ao conceito de Bobath

Penso que qualquer pessoa que esteja minimamente envolvida na questão da intervenção postural percebe que a temática neurológica e neuro-psicomotora é central. De facto, os princípios relativos à inibição tónica e ao evitamento do trabalho de força muscular relevam-nos, quase inevitavelmente, para a lógica do conceito de Bobath e do Neurodesenvolvimento. Afinal de contas foi o método Bobath que tanta importância deu à temática das compensações e do funcionamento corporal como um todo. Foi também o método Bobath que valorizou o funcionamento cinético por padrões, que pode ser, de certo modo, comparado ao funcionamento das cadeias musculares dinâmicas de Busquet. E, em última análise, o método da Reconstrução Postural, já aqui tantas vezes tratado, é uma espécie de método Bobath adaptado de Mézières. Toda a teoria subjacente ao funcionamento do corpo como um todo - tornando o princípio do isolamento um mito - e ao necessário trabalho de inibição do tónus anormal e das forças excessivas, levam-me a dizer que, de certo modo, a Reeducação Postural está mais próxima da intervenção fisioterapêutica em neurologia do que de qualquer outra abordagem. Até me atreveria a dizer que, num certo sentido, muitos terapeutas do neurodesenvolvimento estão mais preparados para a intervenção em deformidades posturais do que, por exemplo, muitos RPGistas.
Ora, se a intervenção corpórea tem tanto da temática neurológica - e até da psicomotricidade - diria que, atendendo ao facto de que o profissional do Fitness é cabalmente ignorante relativamente a estas temáticas, mais uma vez o fisioterapeuta se revela como o profissional mais capaz de tratar dos problemas ditos de "controlo postural". Até o próprio Pilates, a meu ver, vale mais pelos conceitos neurológicos de "estabilização central" e de equilibração do que propriamente pela visão mais "músculo-esquelética" da coisa.
Assim sendo, posso dizer que o trabalho de Reeducação Postural só faz sentido de ser realizado se adequadamente acompanhado de estímulos proprioceptivos, treino de equilíbrio, treino de coordenação e de placing corporal, entre outras coisas.
Tudo isto leva-me a dizer que o fisioterapeuta de Reeducação Postural tem de ser um fisioterapeuta do todo, sendo que a teoria das Cadeias Musculares não pertence, portanto, a uma área específica da fisioterapia, mas sim integra todas as áreas (as quais remanescem artificialmente divididas segundo fronteiras que não passam de facécias artificiais).
A compreensão do conceito relativo à Reeducação Postural implica a reflexão e a valoração de vários conteúdos teóricos, o que me leva a indignar com o facto de os aprendizes da área não valorizarem os pressupostos teoréticos. Vi, nos workshops que dei, uma impaciência imprópria relativamente ao Conceito, o que é erradíssimo; pois, se o fisioterapeuta teima em ser "técnico" sem Conceito e sem Teoria, então, não passa de mero trabalhador manual sem capacidade de raciocício e sem capacidade de criar qualquer tipo de heurística terapêutica. Um profissional não sabedor não saberá sequer como e onde tocar.
Outra coisa que é importante ter em conta é o facto de que toda esta intelectualização inerente aos métodos neurológicos e posturais é totalmente necessária, pois, se a mesma for desconsiderada, isso notar-se-á indubitavelmente na qualidade do terapeuta que manipula.
Por fim, é importante falar do espírito do terapeuta global. Foi-me pedido por gestores de formação que eu pegasse no meu conceito e o transformasse num produto. Ora, tal coisa é cem por cento impossível. E seria, decerto, cometer o mesmo erro que Souchard cometeu com o RPG. Pegou num método totalmente global e inventivo e criou um produto, com regras, sistemas, e toda uma visão estática. Diria até que 99% das formações dirigidas a fisioterapeutas "educam" o fisioterapeuta para fazer algo de determinada forma e não dão ao fisioterapeuta aquela capacidade que é a de ver globalmente o doente e conseguir adaptar-se à idiossincrasia - única e fenomenológica - do doente. Enquanto partidário da fenomenologia e do existencialismo - e, portanto, da liberdade do processo humano - posso dizer que um doente é, a cada momento que passa, um fenómeno único e irrepetível, o qual não pode ser reduzido a receitas, a fórmulas, e a modus operandis. Daí que a quase totalidade das formações existentes contribuam, na realidade, para embotar mais o espírito de um fisioterapeuta crescentemente "máquina". A verdadeira função da formação deveria ser o de criar a capacidade de lidar heuristicamente com cada situação nova que aparece. O bom fisioterapeuta define-se por essa capacidade de raciocício e de criatividade. E, em particular, o bom fisioterapeuta de Reeducação Postural é um escultor que age segundo o que vê e o que sente naquele precisíssimo momento. Produtos e Indústrias, para isso já basta o Fitness que prescreve exercícios como se fossem medicamentos. O verdadeiro terapeuta global, à semelhança do verdadeiro terapeuta de neurologia, age sem regras, tendo a consciência de que um doente é diferente de qualquer outro doente, e, ele próprio, é diferente a cada momento que passa. O método Mézières possuía essa genialidade heurística; daí que Françoise Mézières nunca quisesse que o seu método se massificasse. Já o RPG é pura indústria, com fórmulas criadas para que um produto fosse vendido de uma forma global e massificada. Portanto, de uma vez por todas, assumo que, entre os diversos métodos de Reeducação Postural, o método de Souchard é aquele que menos serve a verdadeira Globalidade postural do sujeito. E os outros métodos neo-mézièristas também seguem a mesma filosofia de industrialização.
Portanto, para mim, o método Mézières e a Reconstrução Postural, à semelhança do conceito Bobath (nas suas linhas mais tradicionais), são os únicos que servem verdadeiramente o modo humano de se ser. É pena ver que a grande generalidade dos terapeutas não possua a flexibilidade e o livre arbítrio necessários ao trabalho em Globalidade. Pois, entenda-se de vez que a Fisioterapia é sobretudo uma arte, não uma ciência. Entende-se melhor a Verdade da Fisioterapia através do modo ideográfico e singular, um doente como uma obra de arte, do que através de generalizações estatísticas feitas por uma ciência inevitavelmente falível.
Perante a crescente capitalização e massificação do mundo em que vivemos, parece que o que vale é um "nome", uma "marca". Para mim, o doente é um Todo e aquilo que lhe dou enquanto fisioterapeuta é o toque necessário à sua transformação, independentemente do nome que lhe dê.
E como dizia Sartre, "estamos condenados a escolher"...

sábado, abril 25, 2009

Imagens históricas

Não quis deixar de partilhar esta imagem do livro "La méthode Mézières. Un concept révolutionnaire". É um conjunto de fotos dos tempos em que Françoise Mézières dava os seus cursos. A obra de que falo é belíssima pelo conjunto dos dados que fornece sobre a dama e os princípios da Reeducação Postural. O francês em que aparece escrito não é complexo e Nisand, o autor do livro, é realmente um dos grandes divulgadores do método, para além de ser, como sabemos, o criador da Reconstrução Postural, sobre a qual já tenho falado no blog. Até breve

terça-feira, abril 14, 2009

Um novo artigo de opinião

Existe uma revista intitulada TDTOnline, na qual, no seu actual número, tenho todo o orgulho de ter publicado um artigo de opinião intitulado "A fisioterapia e o Serviço Nacional de Saúde: a realidade incontornável". Penso que o artigo é bastante explícito sobre a temática - bastante global - em questão. Deixo aqui o link para que possam ler o artigo e explorar a revista: http://www.tdtonline.org/articles.php?id=magazine&mode=view_news&sid=ac303d735d0d276c8f073b6a65a4e9d7#visualizacao
Abraços

quarta-feira, março 25, 2009

Man's Posture. Electromyographic Studies

É o título de uma obra de referência (1960, de J. Joseph), uma monografia sobre o funcionamento da musculatura postural, sobre a electromiografia e sobre os dados que esta forma de medição nos trazem para a temática da Reeducação Postural.
Efectivamente, se a temática do método Mézières, e dos restantes métodos reeducativos, se baseia em axiomas ou a prioris científicos, a electromiografia representa aqui um papel de relevo absoluto.
Classicamente, considera-se que existe algo chamado "tónus muscular", músculos de nome "posturais", e um comportamento que diferencia músculos de dissemelhantes naturezas. A obra em questão dá luz a uma controvérsia antiga: será lícito denominar o "tónus muscular" de "contracção muscular em repouso". Seria lícito fazê-lo se efectivamente os músculos possuíssem todos algum género de actividade neuromuscular remanescente em repouso. Mas o que os estudos e medições electromiográficas vêm demonstrar é que certos músculos, nomeadamente os de natureza fásica e/ou dinâmica, podem chegar ao estado de absoluto repouso (o que, experimentalmente, corresponde à ausência de traçado electromiográfico). O que leva a concluir que o "tónus" deve ser visto mais como o "tipo de resistência que o músculo possui ao alongamento ou mobilização passiva" do que como "contracção em repouso".
Os músculos de natureza fásica podem, efectivamente, alcançar o zero electromiográfico (claro, em condições de ausência de lesão neurológica central). E, de tal forma esta ideia alcançou os cânones do "revolucionário", que depressa se pensou que também os músculos tónicos - sabidamente de tensão constante... e de difícil redução - podiam chegar ao zero electromiográfico em condições de absoluto repouso. Ora, efectivamente, vários estudos demonstraram que o zero electromiográfico é passível de existir nos músculos tónicos. E o que é mais incrível é que essa ausência de actividade neuromuscular dos músculos tónicos está presente também na posição de pé. Ora, não é suposto, por exemplo, os músculos posteriores da coluna estarem em tensão na posição de pé, permitindo a actividade anti-gravítica? Ora, segundo estes estudos, demonstra-se que, afinal, a actividade desses músculos na posição de pé, é mínima. Por outro lado, estudos em que foram utilizados aparelhos de electromiografia mais sensíveis demonstraram que, afinal de contas, os músculos tónicos apresentam um certo nível de actividade, mesmo em repouso... Porém, esse nível de actividade é fundamentalmente expontâneo e pouco expressivo. Os músculos tónicos, científica e garantidamente, trabalham menos do que se pensava para a manutenção da posição de pé. Mas tal só se verifica nas condições de equilíbrio muscular. Ou seja, no caso de existirem desequilíbrios musculares, que podem ou não ser entendidos como deformidades posturais, há já uma grande actividade tónica da parte dos músculos tónicos e/ou anti-gravíticos. O que isto demonstra é que, nas condições normais de postura "equilibrada", a actividade electromiográfica dos músculos tónicos é pequena, sendo mesmo nula em alguns músculos. Só nas condições de desequilíbrio postural é que se verifica um acréscimo de actividade neuromuscular. Ora, então, mais uma vez, se volta à questão do tratamento das deformidades e das patologias neurológicas e reumatológicas em geral: vale a pena fortalecer músculos para tratar desequilíbrios tónico-posturais? Ora, se esses mesmos músculos estão em "excesso" quando há desequilíbrio e mais ou menos inibidos quando há equilíbrio, não passará o tratamento e a fisioterapia em geral pela necessidade de inibição tónica (conseguida por meio de relaxamento, alongamento e outras técnicas de inibição neuromuscular)?... A resposta parece ser óbvia, pois, efectivamente, os tais "problemas de coluna" surgem em indivíduos cujos músculos posturais estão seguramente em excesso, e não fracos, como se pensava!
Falta referir algo: se a posição de pé está muito menos dependente da actividade tónica dos músculos anti-gravíticos do que se pensava, o que é que mantém a posição ortostática? Segundo os vários estudos consultados na obra em análise, a estabilidade em pé depende de: contracção de músculos das pernas (principalmente o solhar), o trabalho dos ligamentos dos joelhos e ancas e a contracção de alguns (somente alguns) músculos da coluna, como os músculos sacro-espinhais. O contributo dos ísquio-tibiais, de muitos outros músculos da coluna e até dos abdominais é muito menor do que aquilo que geralmente se considera. É de sublinhar a importância, para a manutenção da posição de pé, de estruturas fasciais não activas, como ligamentos de certas articulações. (Mas todos estes dados dizem respeito às condições definidas de "média da normalidade"; por exemplo, em certos casos de deformidade, os ísquio-tibiais possuem já grande tensão).
Estas informações estão consubstanciadas pela obra referida, a qual, apesar de antiga, fornece dados únicos, baseados em centenas de estudos. A obra "Man's Posture. Eletromyographic studies", pela natureza (positivista) das medições em que se baseia, mantém toda a sua actualidade, sendo um clássico importantíssimo para a Fisioterapia em geral, dando razão à minoria dos fisioterapeutas de Reeducação Postural e colocando em relevo os dados obtidos e defendidos em tantos outros estudos, os quais, apesar de mais actuais, não possuem a mesma integridade metodológica obtida com a mera observação de medidas electromiográficas.
Termino dizendo que a obra só é obtível pela Internet, tendo demorado um mês a chegar às minhas mãos. Finalmente, devo dizer que quando a empresa de investigação PLUX me convidou para conceber Guidelines de investigação com electromiografia de superfície em Reeducação Postural coloquei logo um problema, e esse problema é bem real: efectivamente, é impossível conceber planos de trabalho ou de investigação em Reeducação Postural com electromiografia de superfície. Para esse tipo de investigação são necessários aparelhos sofisticados de electromiografia de profundidade, sensíveis às mais pequenas variações de actividade neuromuscular desses músculos, as quais são, na realidade, pequenas, se estão mantidas as condições de postura "normal" e "equilibrada".