Nos últimos tempos tenho desdenhado reflectir na legitimidade de intervencionarmos no doente em termos ditos “estruturais” ou “reeducativos”. Se um doente tem determinada perturbação e procura, directa ou indirectamente, um fisioterapeuta, assumimos logo, e à partida, que existe uma condição “anormal” que teremos que “normalizar”. Qualquer acto terapêutico, assim como qualquer acto médico, é uma forma de interferirmos na “natureza” de determinada perturbação, o que nos leva a pensar que o profissional de saúde é sempre um agente de um certo artificialismo, no sentido em que se intromete numa qualquer forma de (des)equilíbrio.
No contexto da Reeducação Postural, é comum encontrarmos certos indivíduos com certas posturas que estão de tal forma “fixadas” ou “estruturadas”, que se torna relevante reflectir até que ponto devemos “interferir” naquilo que vemos. Devemos, por exemplo, deslordosar uma hiperlordose lombar que existe há décadas em determinado indivíduo? Devemos corrigir determinada cifose num indivíduo idoso que nunca fez fisioterapia em toda a sua vida? Devemos induzir alongamentos “correctivos” em indivíduos com idades avançadas que nunca fizeram ou praticaram qualquer tipo de desporto?...
Ora, é preciso entender que é, efectivamente, real que certos indivíduos se encontram fixados ou estruturados em determinados “designs posturais”, o que nos leva a pensar que, no mínimo, a intervenção postural deverá ser feita de forma lenta e subtil. Porém, não posso deixar de pensar que, independentemente do grau de “estruturação” de determinada deformidade, seria um crime não tentar interferir com esse processo, tal como seria um crime deixar evoluir um estado cancerígeno ou deixar que uma demência se instalasse mais precocemente. Portanto, o que pretendo dizer é que mesmo que a patologia postural seja algo “normal” para determinado indivíduo, não podemos deixar de tentar induzir uma nova noção de normalidade, ainda mais porque, se o indivíduo em questão nos procura, é provável que o seu equilíbrio não seja assim tão “normal” (se a dor existe, então algo a provoca...).
Ora, o que pretendo introduzir aqui é a noção de que o “conflito” poderá ser necessário à evolução. Claro que o conflito poderá ser factor de agravamento da dor... E ninguém sabe melhor do que eu que, ao invertermos a evolução de determinada deformidade postural com demasiadada celeridade, arriscamo-nos a aumentar os sintomas ao invés de os reduzirmos. Mas, aparentemente, parece que o que conta é mais a viagem do que o destino, pelo que o conflito é necessário à estruturação de uma nova personalidade corpórea (nem que seja com a ajuda de algum paliativo anti-álgico, um analgésico ou um anti-inflamatório...).
Ninguém melhor do que Hegel espelhou extraordinariamente bem a noção de “evolução por meio de conflito”. Pois, para este filósofo, a evolução do homem, e da sua História, faz-se sempre por um processo dialéctico entre um facto e outro que o contraria; algo a que, mais tarde, se designou denominar respectivamente de “tese” e “antítese”. Ora, da relação entre um factor que tende num sentido e um factor que tende no sentido que, de certa maneira, contraria o primeiro, resulta algo mais organizado, algo mais evoluído, algo que não é só a soma dos factores anteriores. A esse “algo” convencionou-se chamar-se “síntese”. E é precisamente de um conjunto de sínteses que se trata a intervenção postural no ser humano. O que fazemos é, através da exploração de uma antítese (porque contrariamos as hegemonias posturais evolutivas e ontogenéticas), por meio por exemplo da deslordose ou da expiração, induzimos ao estabelecimento de uma síntese que é, no fundo, um estado de organização que tende ao “equilíbrio muscular e postural”.
Portanto, não sei se acredito na ideia de “postura normal para o sujeito”, se essa mesma postura se se afasta muito daquilo que consideramos o “normal” (ex: a 'bela forma' de Mézières). Acredito, sim, que não devemos intervencionar doentes que não possuam manifestações clínicas ou que simplesmente não tenham pedido para ser intervencionados. Mas, se o doente me procura, terá a sorte – ou o azar – de lhe ter calhado um terapeuta de orientação “morfodinâmica”, o qual consubstancia uma intervenção a um nível mais global que as intervenções analíticas (que são, de facto, menos indutoras de qualquer tipo de conflito).
Outra coisa que deverá ser pensada é a utilização de medicamentos como factores que auxiliam a vivência do “conflito”. Se o conflito deverá ser uma condição para a produção de uma nova forma de equilíbrio mais próxima da “homeostase”, não é de negligenciar que é de todo desnecessário tentar realizar a “viagem” no sentido da “síntese” sem a ajuda de métodos que promovam a diminuição das dores. Portanto, nada impede a utilização de algumas terapêuticas anti-sintomáticas, como a medicação analgésica e/ou anti-inflamatória. Para alguns doentes, pode ser a única forma de os intervencionarmos com um nível “sofrível” de dor.
Portanto, termino dizendo que, ao potenciar o paradigma da Reeducação Postural, não me estou a opôr a outras terapêuticas “auxiliadoras”, desde claro que estas últimas não contraponham a lógica da primeira.
No contexto da Reeducação Postural, é comum encontrarmos certos indivíduos com certas posturas que estão de tal forma “fixadas” ou “estruturadas”, que se torna relevante reflectir até que ponto devemos “interferir” naquilo que vemos. Devemos, por exemplo, deslordosar uma hiperlordose lombar que existe há décadas em determinado indivíduo? Devemos corrigir determinada cifose num indivíduo idoso que nunca fez fisioterapia em toda a sua vida? Devemos induzir alongamentos “correctivos” em indivíduos com idades avançadas que nunca fizeram ou praticaram qualquer tipo de desporto?...
Ora, é preciso entender que é, efectivamente, real que certos indivíduos se encontram fixados ou estruturados em determinados “designs posturais”, o que nos leva a pensar que, no mínimo, a intervenção postural deverá ser feita de forma lenta e subtil. Porém, não posso deixar de pensar que, independentemente do grau de “estruturação” de determinada deformidade, seria um crime não tentar interferir com esse processo, tal como seria um crime deixar evoluir um estado cancerígeno ou deixar que uma demência se instalasse mais precocemente. Portanto, o que pretendo dizer é que mesmo que a patologia postural seja algo “normal” para determinado indivíduo, não podemos deixar de tentar induzir uma nova noção de normalidade, ainda mais porque, se o indivíduo em questão nos procura, é provável que o seu equilíbrio não seja assim tão “normal” (se a dor existe, então algo a provoca...).
Ora, o que pretendo introduzir aqui é a noção de que o “conflito” poderá ser necessário à evolução. Claro que o conflito poderá ser factor de agravamento da dor... E ninguém sabe melhor do que eu que, ao invertermos a evolução de determinada deformidade postural com demasiadada celeridade, arriscamo-nos a aumentar os sintomas ao invés de os reduzirmos. Mas, aparentemente, parece que o que conta é mais a viagem do que o destino, pelo que o conflito é necessário à estruturação de uma nova personalidade corpórea (nem que seja com a ajuda de algum paliativo anti-álgico, um analgésico ou um anti-inflamatório...).
Ninguém melhor do que Hegel espelhou extraordinariamente bem a noção de “evolução por meio de conflito”. Pois, para este filósofo, a evolução do homem, e da sua História, faz-se sempre por um processo dialéctico entre um facto e outro que o contraria; algo a que, mais tarde, se designou denominar respectivamente de “tese” e “antítese”. Ora, da relação entre um factor que tende num sentido e um factor que tende no sentido que, de certa maneira, contraria o primeiro, resulta algo mais organizado, algo mais evoluído, algo que não é só a soma dos factores anteriores. A esse “algo” convencionou-se chamar-se “síntese”. E é precisamente de um conjunto de sínteses que se trata a intervenção postural no ser humano. O que fazemos é, através da exploração de uma antítese (porque contrariamos as hegemonias posturais evolutivas e ontogenéticas), por meio por exemplo da deslordose ou da expiração, induzimos ao estabelecimento de uma síntese que é, no fundo, um estado de organização que tende ao “equilíbrio muscular e postural”.
Portanto, não sei se acredito na ideia de “postura normal para o sujeito”, se essa mesma postura se se afasta muito daquilo que consideramos o “normal” (ex: a 'bela forma' de Mézières). Acredito, sim, que não devemos intervencionar doentes que não possuam manifestações clínicas ou que simplesmente não tenham pedido para ser intervencionados. Mas, se o doente me procura, terá a sorte – ou o azar – de lhe ter calhado um terapeuta de orientação “morfodinâmica”, o qual consubstancia uma intervenção a um nível mais global que as intervenções analíticas (que são, de facto, menos indutoras de qualquer tipo de conflito).
Outra coisa que deverá ser pensada é a utilização de medicamentos como factores que auxiliam a vivência do “conflito”. Se o conflito deverá ser uma condição para a produção de uma nova forma de equilíbrio mais próxima da “homeostase”, não é de negligenciar que é de todo desnecessário tentar realizar a “viagem” no sentido da “síntese” sem a ajuda de métodos que promovam a diminuição das dores. Portanto, nada impede a utilização de algumas terapêuticas anti-sintomáticas, como a medicação analgésica e/ou anti-inflamatória. Para alguns doentes, pode ser a única forma de os intervencionarmos com um nível “sofrível” de dor.
Portanto, termino dizendo que, ao potenciar o paradigma da Reeducação Postural, não me estou a opôr a outras terapêuticas “auxiliadoras”, desde claro que estas últimas não contraponham a lógica da primeira.
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