sábado, maio 30, 2009

Viver Saúde

Mais uma vez, mais um ano! Viver Saúde apresenta-se-nos na FIL com uma série de produtos - que é mesmo disso que se trata - vocacionados para o trabalho corpóreo, seja numa componente de saúde complementar, seja numa componente de Fitness. É engraçado ver que as grandes empresas estão lá todas: a Manz, o Pilates Institute, o Pilates Studio, o Instituto de Medicina Tradicional, o Instituto Português de Naturologia... e é de tudo isto que se trata verdadeiramente aquilo que - à semelhança do meu artigo na 'Vértice' - denomino de "Cultura do Corpo e Sociedade de consumo". A maioria destas práticas não permitem a verdadeira "reconstrução psicofísica". São produtos, são modalidades, como se fossem uma ementa de pratos de um restaurante, cujo objectivo é alimentar... alimentar, cada vez mais, a ilusão, a desconstrução e a entropia do sujeito face à desagregação do corpo em capítulos e/ou "escolhas", quando, no fundo, o corpo é um só. Dar ao corpo massagem com bambús ou uma sessão de "privação sensorial", ou uma terapia quântica... fica bem fazer estas coisas como quem vai aos cabeleireiros de luxo, aos spas de referência, ou se hospeda nos hotéis mais luxuosos. Por mim, eu que prefiro as salas bafientas do King às salas pipoqueiras comerciais em matéria de cinema, nesta nossa modernidade vencida pela lei do economato e a lógica do marketing, não posso deixar de ver este ViverSaúde como uma Feira do Relógio, que vende produtos e soluções de bem-estar, sempre uma promessa de salvação face ao mundo "exterior" cheio de agressões. E são poucos os que vêem nestas práticas aquilo que eu vejo: mais uma agressão da parte desse mesmo mundo de intrepidez.
Defendo o regresso ao purismo, à visão parcimoniosa do corpo e da saúde, à simplicidade complexificadora do Corpo Uno e Holístico... pois, no fundo, as coisas são tão simples. E o doente, face ao verdadeiro terapeuta, será sempre alguém cuja solução terapêutica - nunca sendo simples - passa por um caminho, por uma evolução, tão melódica e lenta como a evolução da natureza e o desabrochar de uma flor. Nada de soluções rápidas e milagrosas, nada de sapiência ao desbarato, exposta numa feira de esteticização. O trabalho em saúde está, a meu ver, mais próximo do trabalho do historiador que procura e pesquisa em livros bafientos que já ninguém lê ou prescruta. A cultura dos clássicos é a minha forma de estar na vida e, a meu ver, estes terapeutas pretensamente holísticos destas "feiras da saúde" fazem jus aos médicos de Molière. É a cultura da imagem e da beleza. Mas nem é uma beleza conformada ao conteúdo clássico, é uma beleza feita de artimanhas psicológicas e de estratégias mercantilísticas unidas a uma poderosa lógica utilitarista (quantos mais convencemos mais temos e ganhamos).
Enfim!... É a cultura do efémero, do escapismo e do hedonismo. Já Aristóteles foi bastante claro em referir que a felicidade não tinha nada a ver com prazer, mas sim com equilíbrio... o mesmo equilóbrio que falta neste nosso mundo que mais parece uma praça em que cada peixeira grita mais alto que a outra para vender o seu peixe.
O trabalho em Reeducação Postural, para quem o conhece verdadeiramente, não é fogo de artifício, a não ser que consideremos um espectáculo a normal evolução de uma natureza selvagem e singela. Que tenhamos respeito por essa naturalidade intrínseca das coisas...

3 comentários:

Arrendatário disse...

As pessoas devem saber ocupar o seu lugar, devem fazer o seu trabalho e saber defender as suas ideias sem tentar esmagar as outras correntes, as outras filosofias do exercício físico. Estamos perante uma pessoa que me parece um fundamentalista desmedido e que não mede o que diz, não deve ter medo de nada nem de ninguém, mas para isso é preciso saber-se do que se fala. Não ponho em causa o seu conhecimento na sua área, mas vir falar de uma área que nem se quer sabe definir é grave. Grave é também nos colocarmos numa posição de anti seja o que for, é mau, fica-lhe mal...! Infeliz ou felizmente eu fui um dos que fui atraído pelo título do livro e comprei e li com atenção. Depois da introdução vi alguma ameaça para a minha actividade, mas rapidamente ao fim de algumas páginas percebi que se trata de alguém frustrados, com ideias diferentes, mas que não vendem. Os tempos evoluem e, quer queiramos quer não temos de ser "comercientistas", ou seja, temos que dar aquilo que as pessoas querem mas nunca esquecendo a lógica fisiológica, a ciência, a segurança, etc.
Penso que esta não é a melhor forma de vender uma ideia, é sim a melhor forma de ser falado. Será que lhe vai compensar?
Sozinhos não mudamos o Mundo, já acreditei que o poderia fazer, mas depois fui-me adaptando, e esta é uma palavra chave, adaptação.
Quem não adapta é fundamentalista e os fundamentalistas tem todos o mesmo fim...o descrédito.
Obrigado
Ricardo

Luís Coelho disse...

Caro Ricardo... Que eu saiba o corpo é um só, e, portanto, que fique bem claro que a divisão da matéria corpórea em várias disciplinas ou áreas, ainda mais quando estas se intitulam como áreas de saúde, não faz qualquer sentido e não passa de pura falácia. Na realidade a matéria do Fitness, das medicinas não convencionais e do Wellness esbarram um pouco com o mesmo objecto de estudo e trabalho que o dos fisioterapeutas, com a diferença que as "especialidades" supramente citadas não passam de puro material kitsch e insalubre. Não me sinto nada frustrado pelo facto de não ser um de vós. Antes pelo contrário... Deus queira que nunca venda a alma ao Diabo como vocês fazem todos os dias. A minha matéria e o meu trabalho são de um tracto refinado e são tão súbteis como as transformações da natureza.
Ao contrário do que propõe, não sou fundamentalista, simplesmente tenho consciência que certos postulados - totalmente factuais e científicos - implicam uma revisão em toda a metodologia do "desempenho" no formato de trama desportiva. No fundo, tudo aquilo que vi no Viver Saúde remete para um mundo que é o do horário nobre televisivo. Prefiro a realidade da madrugada!
E se sozinhos não mudamos o mundo, é certo que é esse apego às Estruturas e às Instituições que faz com que tudo fique sempre na mesma. Não acredito em "adaptação". Para mim isso não passa de uma "traição do Eu". Acredito no poder da Identidade e da capacidade de fazermos mais para que este mundo massificado de Indústrias Culturais possa ser desvanecido, no sentido do necessário equilíbrio. Esse equilíbrio, essa homeostasia psicossocial... duvido que faça ideia do que se trata!

Juan Ponce disse...

luís, quero compartilhar uma experiência. eu pratico tai chi chuan tradicional, o que requer muita dedicação e estudo profundo. porém, vejo como o taichi, assim como a yoga estão sendo tratados como produtos, estao sendo dilacerados e encapados com uma couraça superficial.

A sua crítica é real e para poucos.