Seria tarefa hercúlea tentar resumir as "descobertas" que fiz com a obra "Os desequilíbrios estáticos" de Marcel Bienfait. É claro como água que Bienfait é um bom seguidor da Escola francesa, parecendo conhecer relativamente bem a obra de Mézières. Aliás, em especial na obra a que me refiro, Bienfait traça um pouco a evolução histórica da Fisioterapia em França: primeiro temos os recursos de electroterapia, depois vem o conceito de Bobath e, só depois, a Terapia manual em geral; esta última é vista de forma bem abrangente por Bienfait, sendo que, para o autor, inclui tudo desde Mézières até às suas pompages.
A leitura de Bienfait pode ser muito gratificante, ainda mais porque o autor possui uma visão muito realista da intervenção fisioterapêutica nas deformidades posturais. Para ele, a fisioterapia só pode agir nas deformidades primárias e, em certos casos, como nas escolioses de terceiro grau, o trabalho de alongamento muscular global poderá constituir uma "emenda pior que o soneto" no sentido em que pode tornar a deformidade progressiva. É um dado relevante para os fisioterapeutas de Reeducação Postural. Bienfait dá uma grande importância ao conceito de "desequilíbrio muscular", o qual não foi tão importancionalizado quanto isso pelo método Mézières. Outras informações que o autor dá sobre as escolioses e a sua avaliação, são de grande importância, como as diferenças observáveis da deformidade na radiografia feita de manhã vs. ao final do dia.
Bienfait defende, à semelhança de Mézières, a importância da Globalidade no tratamento das deformidades posturais. Mas também defende a importância de se realizarem manobras analíticas dentro dessa mesma globalidade. Para o autor, o trabalho de alongamento global por si só não é suficiente para corrigir certas deformidades mais precisas como a escoliose. O trabalho de alongamento global permite, para ele, o controlo das compensações, as quais tendem a aparecer durante o tratamento. Quanto a este, consiste na introdução de manobras de alongamento mio-fascial e de descompressão articular, que, na tradução brasileira, são designadas de pompages.
Bienfait dá, portanto, um forte contributo para o trabalho de Reeducação Postural, revalorizando o papel das mãos, numa intervenção necessariamente individuada (adaptada à especificidade - verdadeiramente idiossincrática - de cada doente). Ele refere-se ao seu modo de trabalho como a "introdução do analítico na globalidade".
Assume, também, a importância dos osteopatas e do valor que estes sempre deram ao papel da fáscia (já desde os finais do século XIX, antes da emergência do rolfing), enquanto estrutura cuja caracterização anátomo-funcional é mais rica do que a das simples estruturas musculares. Aliás, se assumir-mos que o que nos pretendemos alongar é mais o tecido conjuntivo da fáscia do que o tecido muscular de músculos propriamente ditos, estamos a dar mais um contributo para a ideia de que o alongamento deve ser, efectivamente, longo e progressivo (pois, a natureza do tecido conjuntivo é a de uma maior resistência "elástica" do que a do tecido muscular propriamente dito). Na realidade, sempre que falamos de "cadeia muscular" estamos a referir-nos sobretudo a um sistema fascial, pois aquilo que une conjuntos de músculos é o tecido conjuntivo que os rodeia e integra. Daí que, quando falamos de Reeducação Postural e de alongamento com fins reeducativos, temos de falar cada vez mais do papel da fáscia, "estrutura" particularmente negligenciada no mundo da fisioterapia convencional e do - mais uma vez - fitness.
1 comentário:
Mergulhei nas obras de Marcel Bienfai e apaixonei-me pelo seu trabalho. A integração das suas metodologias na minha prática clínica fizeram toda a diferença.
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