Sabemos todos que existe uma certa tendência para que, numa fase mais ou menos precisa da vida pública nacional, uma certa maleita sofra de um processo de inflação galopante e mediática. É indubitável que o Síndroma da Deficiência Postural, considerada como causa de 10% das dificuldades de aprendizagem em idade escolar, constitui um exemplo de um certo efeito de moda.
Não quero com isto dizer que devamos desvalorizar a relação simbiótica entre corpo e mente que a psicomotricidade e a psico-neurologia muito especificamente têm relevado. Mas, por vezes, exagera-se no cômputo de determinadas perturbações.
Ainda assim, não há dúvidas de que muitos dos problemas de aprendizagem, incluindo a dislexia de desenvolvimento, têm origem numa deformação do esquema corporal, aliás um défice do sistema proprioceptivo. E se a postura está tão dependente do trabalho do sistema nervoso, não podemos negligenciar o papel dos receptores da sensação corporal. No Síndroma da Deficiência Postural, parece haver sempre algum género de perturbação do sistema proprioceptivo, criador de problemas de ordem cerebral, os quais se relacionam com as disfunções cognitivas relacionadas aos problemas de aprendizagem.
O diagnóstico “Síndroma da Deficiência Postural”, associado à escola de Lisboa e ao nome do fisiatra Martins da Cunha é caracterizado por uma série de factores cognitivos. Segundo Alves da Silva, são eles os seguintes: 1) défice de convergência tónica, 2) presença de escotomas, 3) alterações de memória, 4) problemas de concentração, 5) problemas de interpretação, 6) hiperactividade, 7) presença de erros de localização espacial, 8) perda de auto-estima, 9) perturbações de processamento do texto e 10) défice de percepção auditiva.
Os critérios gerais de diagnóstico de Síndroma da Deficiência Postural incluem: a) sintomas cardinais – dor (especificamente raquialgias); perturbações do equilíbrio; alterações da percepção visual; perturbações da somatognósia; b) uma semiologia física característica, podendo incluir: assimetria facial, adopção de uma direcção preferencial do olhar com insuficiência da convergência tónica ocular, e adopção de uma atitude postural cifoescoliótica estereotipada assimétrica, com rotação axial e apoio privilegiado sobre um pé.
O tratamento passa por medidas que envolvem a mudança da mochila, a utilização de calçado apropriado que permita o máximo contacto do pé com o solo, a utilização de vestuário largo, a utilização de mobiliário escolar apropriado que permita a manutenção do equilíbrio das cadeias musculares e a utilização de um colchão apropriado, mas sobretudo pela utilização de lentes prismáticas posturais, pela reprogramação postural (incluindo o trabalho proprioceptivo, as técnicas de consciencialização corporal, a reeducação postural por meio do alongamento global e integração de sensações, e a utilização de palmilhas de reprogramação postural) e a utilização de técnicas psicopedagógicas específicas e adaptadas às dificuldades existentes.
Reparemos que a boa saúde do sistema proprioceptivo está dependente do bom equilíbrio existente entre as cadeias musculares, ou seja, da existência e promoção de uma “morfologia perfeita” (Mézières). O relaxamento muscular é também um dos grandes epítomes de intervenção no respeitante às estratégias de reprogramação postural.
O Síndroma da Deficiência Postural vem mais uma vez lembrar-nos a importância do sistema neurológico nas questões da postura. Ao contrário do que alguns pensam, também os métodos de reeducação postural centrados no alongamento têm como objecto fundamental a integração de um novo esquema corporal, a integração proprioceptiva. Aliás, mesmo no Pilates costuma-se dizer que o mais importante é o conjunto das “sensações” que podemos propiciar aos indivíduos. A anti-ginástica de Bertherat e o método de Courchinoux são igualmente exímios neste tipo de trabalho, aliás modelos do trabalho de integração proprioceptiva.Com tantos recursos existentes na fisioterapia menos convencional, é incrível como a maioria dos casos de Síndroma da Deficiência Postural não passem pelos fisioterapeutas, sendo que, muitas vezes, as actividades de reprogramação postural são realizadas por educadores, entre outros profissionais com uma formação pouca expressiva em termos de métodos psico-corporais.
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