Tenho absoluta consciência de que, desde a sua criação, o meu blogue tem sido visitado sobretudo pela população brasileira. Não é difícil perceber porquê, visto que o blogue é sobre ‘Reeducação Postural’ e especificamente a ‘Reeducação Postural Global’ está (há muito tempo) inflacionada no Brasil enquanto tema dominante, e visto também o meu blogue ser “internacional”, por pertencer ao ‘Google’. Devo dizer que tenho, à custa das visitas dos colegas brasileiros, esboçado muitos conhecimentos, assim como tenho feito amigos e companheiros de ‘MSN’. E já no passado publiquei aqui um texto em que falava um pouco sobre o meu conceito de Fisioterapia no Brasil, o qual é bastante positivo; na realidade, a Fisioterapia no Brasil apresenta um nível de desenvolvimento científico, tecnológico, interdisciplinar, académico (incluindo a existência de ‘especializações’, as quais não existem em Portugal) e social muito superior ao de Portugal.
Tudo isto vem a propósito de uma questão que me é feita muitas vezes pelos fisioterapeutas brasileiros: a situação da profissão e da formação em Fisioterapia em Portugal. O objectivo – claro – é o de alguns dos colegas do “país irmão” visitarem Portugal e, eventualmente, trabalharem cá. Ora, pretendo, neste texto, responder precisamente aos colegas brasileiros que têm essa pretensão...
Na realidade, nada me dá mais prazer do que receber colegas de profissão aqui no nosso pais. Mas, não querendo de forma alguma ter quaisquer segundas intenções ou frustrar a vinda dos colegas, devo desde já dizer que, a cada segundo que passa, merece cada vez menos a pena visitar Portugal.
Há uns anos atrás, arranjar emprego em Fisioterapia em Portugal era relativamente fácil, mas, precisamente porque havia grande oferta de empregos, e também devido à falta de legislação associada a múltiplos corporativismos, o número de escolas de Fisioterapia passou de quatro ou cinco para 17. Ora, isto fez com que, em poucos anos, o número de fisioterapeutas aumentasse exponencialmente. Temos, efectivamente, no tempo presente, fisioterapeutas a mais para as necessidades actuais do mercado português (e este evolui à velocidade da tartaruga...). E, acrescentando a isso a emergente crise económica do nosso país e a consequente desvalorização monetária e social da Fisioterapia (e das suas tabelas financeiras), a profissão é cada vez mais mal paga. Para além disso, a situação da maioria dos fisioterapeutas portugueses é precária, com entradas para a Função Pública há muito congeladas.
Mas os males da Fisioterapia em Portugal não se ficam por aqui. Por exemplo, o curso de Fisioterapia ainda está ao nível do politécnico (apesar de já existirem muitos mestrados e doutoramentos universitários na área), sem especializações, e com um investimento conceptual e tecnológico pobre. Em tudo, ou quase tudo, a Fisioterapia brasileira está mais evoluída que a portuguesa, incluindo o facto de áreas como a ergonomia, a osteopatia e a quiroprática serem, como acredito que devem ser, especialidades da Fisioterapia no Brasil, enquanto que aqui são profissões autónomas, que advogam uma pretensa autonomia profissional e também teorética e metodológica. Posso acrescentar também que, aqui em Portugal, os cursos são crescentemente mal dirigidos (como todos os cursos de outras áreas), com recurso cada vez maior ao facilitismo, incluindo professores sem qualquer “obra académica”.
Poderia acrescentar que os fisioterapeutas portugueses são mal reconhecidos e mal representados socialmente na mente dos próprios portugueses, e que a profissão não possui Ordem ou qualquer tipo de influência política ou corporativa. Nos Hospitais, por exemplo, a Fisioterapia não costuma ter Serviço próprio, é apenas um Departamento integrado num Serviço de ‘Medicina Física e de Reabilitação’.
Ora, a realidade actual é precisamente a de que os fisioterapeutas são muitos e mal pagos, mal respeitados apesar de crescentemente sabedores e capacitados, e que o precário desenvolvimento económico do país não promete o crescimento do mercado e a mudança de mentalidades.
Por outro lado, na minha visão, a Fisioterapia no Brasil possui mais respeitabilidade, mais áreas de intervenção, mais coerência académica e disciplinar, e até mais suporte tecnológico e político-administrativo. É verdade que, à semelhança de Portugal, os fisioterapeutas brasileiros são muitos e que o mercado não absorve todos os que existem, existindo um desemprego pandémico entre os fisioterapeutas brasileiros. Mas essa mesma situação já está praticamente igualada em Portugal (ou para lá rapidamente caminha), com muitos fisioterapeutas portugueses a escolherem emigrar para a França, a Itália, a Suíça ou o Luxemburgo, locais onde as coisas correm aparentemente melhor.
É certo que o Brasil possui um mercado muito esgotado. Mas também é certo que, apesar de muitos brasileiros não o sentirem, a economia brasileira está a expandir-se de tal modo que é provável que a situação no Brasil venha a mudar muito nos próximos anos. Já a crise económica portuguesa não tem perspectivas de melhoras (actualmente até vivemos numa aproximação “virtual” à bancarrota e à implosão dos mercados financeiros nacionais e internacionais), e, portanto, a ideia de que “o mercado é que tem de mudar” não passa disso mesmo...de uma ideia.
Por tudo o que deixo dito, devo então concluir que, apesar de serem – pelo menos por mim – bem vindos a Portugal, é possível que alguns dos fisioterapeutas brasileiros não consigam ter sucesso neste nosso país em crise estrutural profunda. É sempre bom conhecer um país do velho Continente, até porque Portugal tem um lindo património histórico-cultural, mas as perspectivas de encontrar emprego ou boas formações em Portugal é pequena. E a perspectiva de se fazer uma pós-graduação em Portugal parece ‘positiva’, mas não me consigo lembrar de nenhuma área de intervenção da Fisioterapia portuguesa em que os brasileiros não estejam mais desenvolvidos; penso que a diferença poderá residir na própria ‘Reeducação Postural’, com métodos como a base do “Método Mézières” a terem formação em Portugal e sem formação no Brasil.