Dia 21 de Junho é o dia mundial do Yoga, o qual tem sido anunciado com uma certa rejubilação nos órgãos publicitários mais mediáticos. E dia 21 é também um dia triste para a Saúde mundial, pois, sendo esse mesmo dia dedicado a uma prática que fundamenta a destruição voraz das estruturas ósteo-articulares dos praticantes, este mesmo dia fica, de facto, consagrado à geração Yoga, que podia ser também a Geração 'Estética corporal', que também poderia ser Geração 'Holmes Place' ou 'Viva Fit', Geração 'Fitness' ou Geração 'Wellness'...
Enquanto fisioterapeuta de Reeducação Postural que sou, e sabendo que a saúde reumatológica dos potenciais pacientes que todos somos depende do normal ou anormal estado de tensão das estruturas de tecidos moles que envolvem as articulações, tenho defendido com persistência que a prática contínua de desportos que importancionalizam o trabalho de força, ou então a prática de actividades milenares que desconhecem as bases científicas que permeiam a diferença entre musculatura tónica/estática e musculatura fásica/dinâmica (como o Yoga ou o Chi-Kung), leva inevitavelmente, no longo prazo estrutural, à destruição do “corpus” frágil que todo o ser humano constitui.
É com pena que vejo que, neste nosso contexto 'neoliberal' de frio calculismo mercantil, se tenha criado e consubstanciado um mercado corporal de práticas rituais que, ao invés de propiciarem a verdadeira saúde holística do corpo, propiciam o escapismo e a destruição pela esteticização compulsiva, dando origem a um produto que é na realidade o dos futuros clientes dos fisioterapeutas.
Defendo e tenho defendido que vivemos nos auspícios de uma “indústria do corpo”, que torna o objecto corpóreo, palco do sofrimento psicossomático, vítima de mercados e instituições de puro cinismo lucrativo, sendo que três 'indústrias' são particularmente afamadas: o wellness, as medicinas não convencionais e o fitness. Todas elas têm em comum servirem-se de uma capa de “trabalho de e para a saúde”, com base em estudos científicos que são na realidade pura barganha de 'massa' quantificativa e pobre riqueza conteudística e metodológica, quando, no fundo, arrogam-se a destruir o corpo e a criar a dependência das suas próprias práticas, o que é defensável para o objecto do nosso mundo puro do Capital.
Este, e em especial os produtos quiméricos e um tanto “místicos” como o Yoga, são na realidade o exacerbar do espírito das “Indústrias culturais”, tal como foram compreendidas pelos filósofos pós-marxistas da escola de Frankfurt.
O Yoga exemplifica vivamente o que me pretendo defender. É, supostamente, uma prática milenar centrada na saúde psicofísica do utente. As suas posturas, a sua respiração e, em geral, a sua filosofia, consubstanciam a saúde corpórea global ao mais alto nível. Mas, na verdadeira realidade, qualquer fisioterapeuta reconhece nas ásanas (posturas) do Yoga uma potencialidade destrutiva das articulações sem qualquer margem para limites. Por exemplo, as “torções” e as “invertidas” são perigosíssimas para possíveis e potenciais hérnias discais; as “extensões” comprometem a saúde postural, fortalecendo a cadeia muscular posterior, rica em músculos hipertónicos de grande tensão, que se queria refreada. E a presunção de que o instrutor de Yoga prescreve a diferenciação idiossincrática e potencialmente casuística dos seus utentes ou alunos é pura falácia, pois estas várias práticas, que de Fitness se tratam, apresentam-se particularmente massificadas, criadas para grupos em que não faz qualquer sentido encarar a Verdade fenomenológica do utente.
O dia mundial do Yoga representa, portanto, o dia do Corpo frágil, no sentido em que, sob a capa de um poderoso conteúdo comercialista e um intrépido produto da Imagem propiciada pelo frio 'marketing', esta prática, tal como tantas outras supostamente sábias porque ancilares, alimenta a patologia, sob o disfarce da saúde, a qual se confunde com a diluição de sintomas físicos, esta muitas vezes só e meramente “efeito placebo”.
Tudo aquilo a que me refiro foi bem definido por Baudrillard na sua “Sociedade de consumo”, o qual argumenta que a descoberta do corpo, “após uma era milenária de puritanismo, sob o signo da libertação física e sexual, a sua omnipresença na publicidade, na moda e na cultura das massas – o culto higiénico, dietético e terapêutico com que se rodeia, a obsessão pela juventude, elegância, virilidade/feminilidade, cuidados, regimes, práticas sacrificiais que com ele se conectam, o Mito do Prazer que o circunda – tudo hoje testemunha que o corpo se tornou objecto de salvação, substituindo literalmente a alma nesta função moral e ideológica. Significa isto que o corpo não é uma evidência, o corpo é um facto de cultura.”
Também José Gil, no seu “Metamorfoses do corpo” diz «Assiste-se actualmente, depois do esforço psicanalítico, a uma verdadeira invasão do culto do corpo – visível, sobretudo através das dezenas de métodos terapêuticos que florescem nos Estados Unidos. Pretende-se fazer falar o corpo, descobre-se a propósito de tudo e de nada “um discurso do corpo”, pretende-se que ele se liberte ou se exprima. Como se o objectivo fosse, neste momento, descobrir uma língua do corpo à qual se subordinaria qualquer terapia ou outra forma de linguagem: artística, literária, teatral ou simplesmente comunitária. Muito estranhamente, na mesma altura em que esta voga testemunha uma sensibilização crescente pelos problemas do corpo tendente a afirmar a sua importância nos mais diversos domínios, retomam-se velhas ideias, velhos esquemas – idênticos aos regimes de signos que serviram para a exploração do corpo: este tornou-se o significante despótico que resolverá tudo, desde o declínio da cultura ocidental até aos menores conflitos intra-individuais. Uma tal concepção seria inofensiva se não fizesse passar o corpo por o significante supremo que, recobrindo um vazio, faz as vezes de tudo aquilo de que os nossos corpos foram desapossados – pelo menos desde a desagregação das culturais arcaicas. Que corpo é este, em volta do qual se agitam estas terapias? Uma análise superficial revelaria neste campo uma maneira de fazer violência aos corpos – tomando, às vezes, as formas mais nuas de cinismo mercantil.»
Como concordo com este conceito de violência!... Como se me agita a necessidade de constituição de uma nova epistemologia da postura e da motricidade, uma renovada teoria da corporeidade e uma completamente revolucionada metodologia do desporto e da ciência – supostamente rigorosa – que o consubstancia!...
O dia mundial do Yoga representa tudo aquilo que o Corpo é na sociedade actual: um objecto que já não somos, somente temos e consumimos.
Enquanto fisioterapeuta de Reeducação Postural que sou, e sabendo que a saúde reumatológica dos potenciais pacientes que todos somos depende do normal ou anormal estado de tensão das estruturas de tecidos moles que envolvem as articulações, tenho defendido com persistência que a prática contínua de desportos que importancionalizam o trabalho de força, ou então a prática de actividades milenares que desconhecem as bases científicas que permeiam a diferença entre musculatura tónica/estática e musculatura fásica/dinâmica (como o Yoga ou o Chi-Kung), leva inevitavelmente, no longo prazo estrutural, à destruição do “corpus” frágil que todo o ser humano constitui.
É com pena que vejo que, neste nosso contexto 'neoliberal' de frio calculismo mercantil, se tenha criado e consubstanciado um mercado corporal de práticas rituais que, ao invés de propiciarem a verdadeira saúde holística do corpo, propiciam o escapismo e a destruição pela esteticização compulsiva, dando origem a um produto que é na realidade o dos futuros clientes dos fisioterapeutas.
Defendo e tenho defendido que vivemos nos auspícios de uma “indústria do corpo”, que torna o objecto corpóreo, palco do sofrimento psicossomático, vítima de mercados e instituições de puro cinismo lucrativo, sendo que três 'indústrias' são particularmente afamadas: o wellness, as medicinas não convencionais e o fitness. Todas elas têm em comum servirem-se de uma capa de “trabalho de e para a saúde”, com base em estudos científicos que são na realidade pura barganha de 'massa' quantificativa e pobre riqueza conteudística e metodológica, quando, no fundo, arrogam-se a destruir o corpo e a criar a dependência das suas próprias práticas, o que é defensável para o objecto do nosso mundo puro do Capital.
Este, e em especial os produtos quiméricos e um tanto “místicos” como o Yoga, são na realidade o exacerbar do espírito das “Indústrias culturais”, tal como foram compreendidas pelos filósofos pós-marxistas da escola de Frankfurt.
O Yoga exemplifica vivamente o que me pretendo defender. É, supostamente, uma prática milenar centrada na saúde psicofísica do utente. As suas posturas, a sua respiração e, em geral, a sua filosofia, consubstanciam a saúde corpórea global ao mais alto nível. Mas, na verdadeira realidade, qualquer fisioterapeuta reconhece nas ásanas (posturas) do Yoga uma potencialidade destrutiva das articulações sem qualquer margem para limites. Por exemplo, as “torções” e as “invertidas” são perigosíssimas para possíveis e potenciais hérnias discais; as “extensões” comprometem a saúde postural, fortalecendo a cadeia muscular posterior, rica em músculos hipertónicos de grande tensão, que se queria refreada. E a presunção de que o instrutor de Yoga prescreve a diferenciação idiossincrática e potencialmente casuística dos seus utentes ou alunos é pura falácia, pois estas várias práticas, que de Fitness se tratam, apresentam-se particularmente massificadas, criadas para grupos em que não faz qualquer sentido encarar a Verdade fenomenológica do utente.
O dia mundial do Yoga representa, portanto, o dia do Corpo frágil, no sentido em que, sob a capa de um poderoso conteúdo comercialista e um intrépido produto da Imagem propiciada pelo frio 'marketing', esta prática, tal como tantas outras supostamente sábias porque ancilares, alimenta a patologia, sob o disfarce da saúde, a qual se confunde com a diluição de sintomas físicos, esta muitas vezes só e meramente “efeito placebo”.
Tudo aquilo a que me refiro foi bem definido por Baudrillard na sua “Sociedade de consumo”, o qual argumenta que a descoberta do corpo, “após uma era milenária de puritanismo, sob o signo da libertação física e sexual, a sua omnipresença na publicidade, na moda e na cultura das massas – o culto higiénico, dietético e terapêutico com que se rodeia, a obsessão pela juventude, elegância, virilidade/feminilidade, cuidados, regimes, práticas sacrificiais que com ele se conectam, o Mito do Prazer que o circunda – tudo hoje testemunha que o corpo se tornou objecto de salvação, substituindo literalmente a alma nesta função moral e ideológica. Significa isto que o corpo não é uma evidência, o corpo é um facto de cultura.”
Também José Gil, no seu “Metamorfoses do corpo” diz «Assiste-se actualmente, depois do esforço psicanalítico, a uma verdadeira invasão do culto do corpo – visível, sobretudo através das dezenas de métodos terapêuticos que florescem nos Estados Unidos. Pretende-se fazer falar o corpo, descobre-se a propósito de tudo e de nada “um discurso do corpo”, pretende-se que ele se liberte ou se exprima. Como se o objectivo fosse, neste momento, descobrir uma língua do corpo à qual se subordinaria qualquer terapia ou outra forma de linguagem: artística, literária, teatral ou simplesmente comunitária. Muito estranhamente, na mesma altura em que esta voga testemunha uma sensibilização crescente pelos problemas do corpo tendente a afirmar a sua importância nos mais diversos domínios, retomam-se velhas ideias, velhos esquemas – idênticos aos regimes de signos que serviram para a exploração do corpo: este tornou-se o significante despótico que resolverá tudo, desde o declínio da cultura ocidental até aos menores conflitos intra-individuais. Uma tal concepção seria inofensiva se não fizesse passar o corpo por o significante supremo que, recobrindo um vazio, faz as vezes de tudo aquilo de que os nossos corpos foram desapossados – pelo menos desde a desagregação das culturais arcaicas. Que corpo é este, em volta do qual se agitam estas terapias? Uma análise superficial revelaria neste campo uma maneira de fazer violência aos corpos – tomando, às vezes, as formas mais nuas de cinismo mercantil.»
Como concordo com este conceito de violência!... Como se me agita a necessidade de constituição de uma nova epistemologia da postura e da motricidade, uma renovada teoria da corporeidade e uma completamente revolucionada metodologia do desporto e da ciência – supostamente rigorosa – que o consubstancia!...
O dia mundial do Yoga representa tudo aquilo que o Corpo é na sociedade actual: um objecto que já não somos, somente temos e consumimos.