quinta-feira, janeiro 29, 2009

Morfoanálise e outras (des)loucuras

É difícil explicar às pessoas a verdadeira natureza da Reeducação Postural. Hoje mesmo, quando tratava um rapaz “normal”, com uma escoliose e com “traços” de hipertonicidade muscular, quando via o quanto ele tremia com o meu contacto manual, e o quanto o corpo dele compensava com as tentativas de alongamento global, vi, melhor do que nunca, o poder da visão “Global” e nominalista que importa à teoria das Cadeias musculares. Um bom terapeuta de Reeducação Postural, um bom terapeuta capaz de lidar com aquela situação que denuncia uma destruturação muito mais global do que meramente “física” implica uma PESSOA, um ser humano integral. E, hoje mesmo, perante aquele rapaz que possui uma relação conflituosa com o seu corpo e consigo mesmo (psiquicamente), apercebi-me o quanto o trabalho do terapeuta é de um nível de Globalidade psicofísica só verdadeiramente “entendível” por quem consiga olhar o seu próprio interior. Portanto, o bom terapeuta de Reeducação Postural não é propriamente aquele que possui cursos atrás de cursos ligados à área. É aquele que é capaz de escapar ao “engate” ou à “ilusão” desses tantos cursos e/ou formações que existem (percebendo que, por trás disso tudo, há uma máquina comercial de exploração do terapeuta recém-licenciado... e, portanto, metodologicamente inseguro), conseguindo tornar-se uma extensão do corpo do doente. O corpo do doente passa a ser uma parte de nós e nós tentamos compreender esse corpo como um TODO. Se compreendermos a mecânica fundamental da “coisa”, então passamos a entender que não há cursos ou formações que substituam a experiência in vivo. Não há “RPGs” ou “Cadeias musculares” que me possam ensinar a ver e a “sentir” (porque é de “sentir” que verdadeiramente se trata) como vi e senti a extensão corporal deste meu doente único e singular.
Em última análise, o método “morfoanalítico” chegou à mais correcta designação possível para o trabalho em “Cadeias musculares”. Porque o nosso trabalho é mesmo o de uma análise constante, um ajuste de compensações constante, aliado à compreensão das “sensações” do doente. A Reeducação Postural, incluindo o sistema de defesas e reflexos do corpo, é uma morfoanálise! Está, portanto, para a Fisioterapia convencional e científica como a Psicanálise está para a Psiquiatria convencional e científica.
O trabalho em Reeducação Postural releva de uma Teoria de tal forma postular e quase tautológica, que não há qualquer tipo de Ciência que possa infirmar as observações paradigmáticas de Mézières e os princípios fundamentais subjacentes à “teoria das Cadeias musculares”. Portanto, defendo que este género de terapeutas morfoanalistas será sempre um género “outsider”, “estrangeiro” relativamente à Fisioterapia “científica”, aquela que é supostamente a Verdadeira.
Também a Psicanálise é pouco compreendida pela maioria dos psicólogos e psiquiatras. E ela criou as suas próprias revistas e formas de afirmação, quando as revistas científicas não davam aos psicanalistas chances de se exprimirem.
Também eu, enquanto mézièrista, tenho dificuldades em passar a fragrância do método Mézières para artigos científicos. Este tipo de Teoria ou Conceito só pode ser exprimido em artigos ditos de “Opinião”, que são, na realidade, os que mais adoro fazer.
O livro que publiquei teve como principal fundamento isso mesmo: publicar algo impublicável na maioria das revistas “técnicas”. E sei que somente uma parte das pessoas que o lerem compreenderão em que consiste o conceito de Anti-Fitness. Diria que o conceito de Anti-Fitness se aproxima muito do conceito de “Traição do Eu” de Arno Gruen. Para este psicanalista, quase todos nos traímos diariamente nesta nossa sociedade da ilusão e da alienação. Todos tentamos chegar lá “acima” por meio do sucesso profissional e académico, quando no fundo o que interessa é o grau de cisão com o nosso interior. Daí Gruen falar da “Loucura da normalidade”.
Também a Reeducação Postural é uma forma de loucura, pois sai fora dos cânones de academismo. E o verdadeiro terapeuta não é, de facto, o que tem as melhores notas ou o que tem mestrados e mil doutoramentos, mas sim aquele que concebe o doente como um Todo, e que concebe a Totalidade das coisas como uma Totalidade que o envolve a ele mesmo física e psiquicamente.
Como falar do inexprimível? Como explicar este conceito ao fisioterapeuta que diz “faz natação” ou ao médico que diz “ele precisa de um reforço muscular”? Como explicar que a Verdade parece, na realidade, estar mais numa minoria, a qual não possui voz suficientemente audível? Como fazer frente a esta injustiça global de que a Verdade esteja nas minorias? Como fazer relativamente ao facto de, à semelhança do que acontece com Nietzsche ou, mais modernamente, Woody Allen, que nada podemos fazer face à realidade da ausência de Justiça Divina, uma justiça que torne tudo “Justo e real”?...
Para o alienista de Machado de Assis, as minhas afirmações seriam loucura num tempo e a maior desloucura noutro tempo. Pois o que é a Verdade? Ou as Verdades?...
E podia continuar a escrever eternamente...
Exprimam-se agora vocês leitores, mostrando a vossa força.

1 comentário:

Jocelia disse...

Bem, minha formação é um pouco parecida - sou orgonoterapeuta(REICH)- e gostaria de saber como vcs trabalham a transferência.

Abçs

Jocélia de Souza Lima